Já aqui mencionei o livro, cito agora uma passagem da crítica de Dutra Faria, director executivo da ANI, publicada em Boletim de 01 de Março de 1974.
Lido este livro de António de Spínola com a atenção com que sempre leio (e medito) quanto ele escreve, a impressão que sinceramente me ficou foi a de que no fundamental, repito, não há conflito entre o que ele quer e aquilo que o Governo a que preside o Prof. Marcello Caetano deseja; o que há, isso há, é diferenças de vocabulário, de perspectiva relativamente à comunidade internacional, de formação espiritual – e até de temperatura: Spínola é um homem ardente, impulsivo, vibrante de entusiasmo por toda a causa a que se dedica.
(...)
De qualquer modo, o que importa evitar é que ao livro sério que o general António de Spínola escreveu o transformem agora gregos e troianos em objecto de fácil polémica. Para o discutir há que entendê-lo e para o entender há que sentir a África. Os outros, os que não a sentem nem a amam, têm de ficar à margem do debate. Não é de política que se trata, meus senhores é de algo de muito mais importante.
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De qualquer modo, o que importa evitar é que ao livro sério que o general António de Spínola escreveu o transformem agora gregos e troianos em objecto de fácil polémica. Para o discutir há que entendê-lo e para o entender há que sentir a África. Os outros, os que não a sentem nem a amam, têm de ficar à margem do debate. Não é de política que se trata, meus senhores é de algo de muito mais importante.
3 comentários:
Como mera opinião pessoal, discutivel, como é óbvio, não considero o livro do Spínola fundamental para o desencadear do 25 de Abril. Ajudou a uma outra aceleração do processo mas não decisivo. Decisivo terá sido o encontro dos capitães em Évora no dia 9 de Setembro de 1973. Porque todos os começos são dificeis...
Qunado Spínola fornece as ideias para que um "escritor-fantasma" escreva o livro, o que pode ter provocado é o chamado "Golpe das Caldas", mas ´não o 25 de Abril.
Claro que isto são interpretações pessoais e o que no fundo o o "post" pretende é, registar, justamente, uma efeméride, um ponto na história do 25 de Abril.
O livro de Spínola é mais um episódio do desmembramento da "aliança de classes" que formou e manteve a ditadura. Nesse aspecto, insere-se num movimento que o crescimento económico forjado pelo chamado "modelo EFTA" gerou nos anos 60 e que levou ao afastamento do regime dos sectores desenvolvimentistas, atraídos por uma maior integração europeia. E sem resolução do problema colonial essa integração seria impossível. Outros sintomas são a formação da "ala liberal", a SEDES, a criação do "Expresso", a importância da intervenção crescente de alguns sectores católicos ligados à JUC e, inclusivamente, a simpatia com que alguns grupos económicos acolhem alguns desses acontecimentos. A ruptura dessa aliança, aliás, é já notória no período do governo de Caetano e causa das dificuldades por este sentidas. No final dos anos 60 a oposição deixa de ser apenas "coisa" de comunistas e velhos repúblicanos. O livro de Spínola (aliás, um político inábil) tem apenas a importância de vir de um militar prestigiado e ocupando um alto cargo na hierarquia militar. Uns anos antes (1962), Manuel José Homem de Mello (um homem do regime) tinha escrito algo de semelhante num livro premonitório ("Portugal, o Ultramar e o Futuro") com prefácio do... Marechal Craveiro Lopes, tb ele a assumir algum distanciamento face à ditadura.
Basicamente de acordo, com os dois comentários anteriores. Ou seja, há um conjunto vasto de condições que permitiram o 25 de Abril tal como o conhecemos. Não há, como é óbvio, um único "porquê", a não ser um desejo autêntico de acabar com uma ditadura asfixiante, injusta e inglória.
JC cita vários momentos, com os quais estou inteiramente de acordo: a chamada ala liberal, a SEDES, o "Expresso", os católicos progressistas, o livro de Manuel José de Mello...
Curiosamente, estou a rever a imprensa de 1969 (primeiro ano da "primavera marcelista", "eleições", entrevistas de Spínola...) e, sabendo o que sei hoje, estou a ver ali o germinal do 25 de Abril.
Quanto ao meu amigo Gin-Tonic, noto no seu comentário um certo desmerecimento do livro de Spínola. Não estou tão certo disso.
Sei da importância da reunião de Évora, é claro, - e de outras -, mas não posso esquecer o incentivo que para a Revolução dos Cravos foi dado pela demissão dos Chefe e Vice-Chefe do EMGFA, precisamente na sequência do livro de Spínola.
E não nos esqueçamos do chamado 1º (e único) Congresso dos Combatentes, realizado de 01 a 03 de Junho de 1973, no Palácio de Cristal, no Porto.
LT
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