quinta-feira, 24 de julho de 2008

1ª ENTREVISTA DE DYLAN PARA PRESS RELEASE


O Billy vestia à Ivy League como se tivesse acabado de sair de Yale - estatura média, cabelo preto encaracolado. Tinha ar de quem nunca se tinha pedrado na vida, de quem nunca se metera em sarilhos.

Entrei a medo no gabinete dele, sentei-me à frente da secretária e ele tentou arrancar-me alguns factos, como se eu tivesse que lhos dar logo ali e sem mais.

Pegou num bloco de notas e num lápis e perguntou-me de onde é que eu era. Disse-lhe que era do Illinois e ele anotou.

Perguntou-me se já tinha tido outro trabalho e respondi-lhe que já tinha tido uma dúzia de empregos, até conduzira uma vez uma carrinha de padaria.

Anotou tudo e perguntou-me se havia mais alguma coisa. Disse-lhe que já tinha trabalhado nas obras e ele perguntou-me onde.

- Em Detroit.

- Já viajaste um bocado, não?

- Pois.

Perguntou-me àcerca da minha família, de onde eram. Disse-lhe que não fazia ideia, que tinham morrido, há muito tempo.

- Como era a tua vida em casa?

Disse-lhe que tinha sido corrido.

- O que é que o teu pai fazia?

- 'lectricista.

- E a tua mãe, como era?

- Dona de casa.

- Que tipo de música é que tocas?

- Música folk.

Que género de música é a música folk?

Disse-lhe que eram canções que vão passando e se apanham por aí. Detestava este tipo de perguntas. Achei que podia ignorá-las. Billy parecia que tinha dúvidas a meu espeito e cá por mim tudo bem. De resto, não me apetecia responder às perguntas e não sentia necessidade de explicar o que quer que fosse a ninguém.

- Como é que chegaste aqui?

- Vim à boleia num comboio de mercadorias.

- Quer dizer, comboio de passageiros?

- Não, comboio de mercadorias.

- Quer dizer, num vagão de carga?

- Isso, num vagão de carga. Como num comboio de mercadorias.

- Ou isso, num comboio de mercadorias.

"Crónicas - Volume I", Bob Dylan, Ulisseia, 217 págs. €10.49

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