«Sempre conheci a Beatriz Costa anti-salazarista furiosa. -No princípio do verão encontrei-a no comboio de Cascais a dizer mal do Salazar com voz tão estridente que o actor Assis Pacheco teve de metê-la na ordem. «Cala-te! Pois não vês que está ali um tipo com cara de Pide?» - contou-me o Mário Dionisio. Mas assim que o Salazar caiu doente, a querida Beatriz Costa tão progressista e anti-salazarista etc., correu logo ao hospital da Cruz Vermelha a inscrever-se no rol dos que desejavam ardentemente as melhoras do Paizinho. - Nunca mais apareceu na Brasileira do Chiado, onde é cliente assídua – disse-me o Salgado – Tem medo que a comam viva. Pobre Beatriz! Tão inteligente, viva, azougada, talentosa, socialista talvez! E actriz também, não nos esqueçamos. Actriz do velho estilo venal e sentimentaloide, cheia de pena das desgraças alheias («Coitadinho!» para a direita! Beijinhos para a esquerda!), embora terrivelmente fria, com o coração de cofre de barro para guardar moedas… Enquanto falava com o Mário Dionísio, ia-me rindo de mim para mim, porque me veio à lembrança uma história que lhe ouvi contar, há muitos, muitos anos. Foi o caso que o Salazar (que nunca frequentava teatros de revista) teve um dia o capricho de conhecer a Beatriz Costa, então na berra entusiástica do público. A vedeta acedeu, claro. E preparou-se para ir à amostra a casa de Sua Excelência. - Pelo sim pelo não… - comentava ela – lavei-me por baixo e pus uma combinação nova… E, com tristeza de Pompadour malograda concluía: - Mas não aconteceu nada!»
1 comentário:
José Gomes Ferreira nos seis «Dias Comuns»
«Sempre conheci a Beatriz Costa anti-salazarista furiosa.
-No princípio do verão encontrei-a no comboio de Cascais a dizer mal do Salazar com voz tão estridente que o actor Assis Pacheco teve de metê-la na ordem. «Cala-te! Pois não vês que está ali um tipo com cara de Pide?» - contou-me o Mário Dionisio.
Mas assim que o Salazar caiu doente, a querida Beatriz Costa tão progressista e anti-salazarista etc., correu logo ao hospital da Cruz Vermelha a inscrever-se no rol dos que desejavam ardentemente as melhoras do Paizinho.
- Nunca mais apareceu na Brasileira do Chiado, onde é cliente assídua – disse-me o Salgado – Tem medo que a comam viva.
Pobre Beatriz! Tão inteligente, viva, azougada, talentosa, socialista talvez! E actriz também, não nos esqueçamos. Actriz do velho estilo venal e sentimentaloide, cheia de pena das desgraças alheias («Coitadinho!» para a direita! Beijinhos para a esquerda!), embora terrivelmente fria, com o coração de cofre de barro para guardar moedas…
Enquanto falava com o Mário Dionísio, ia-me rindo de mim para mim, porque me veio à lembrança uma história que lhe ouvi contar, há muitos, muitos anos.
Foi o caso que o Salazar (que nunca frequentava teatros de revista) teve um dia o capricho de conhecer a Beatriz Costa, então na berra entusiástica do público.
A vedeta acedeu, claro. E preparou-se para ir à amostra a casa de Sua Excelência.
- Pelo sim pelo não… - comentava ela – lavei-me por baixo e pus uma combinação nova…
E, com tristeza de Pompadour malograda concluía:
- Mas não aconteceu nada!»
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