Estranha ironia essa, a da história de um conjunto que nasceu quarteto, amadureceu quinteto e, já que na fama granjeada não podia alterar o nome, teve que lhe acrescentar “+ 2”, porque os 7 músicos da sua última formação já não cabiam no seu título.
E foram, ao todo, 32, os músicos que, ao longo dos 8 anos dessa fulgurante carreira do Quinteto Académico por ele passaram e, em sucessivas etapas, o fizeram ascender a um nível qualitativo sem paralelo, à época, em Portugal.
O que nascera, nos idos de 61, como uma diletante experiência de quatro amigos e colegas do liceu – o Daniel Gouveia, o Artur Pinto, o Silva Duarte e eu – logo se viria a transformar, após o ingresso do José Manuel Fonseca e do seu saxofone, num fenómeno de popularidade em que, – sobretudo nesses primeiros tempos, – nem sempre a qualidade musical estaria à altura da reputação alcançada.
A começar por mim, incipiente guitarrista e vocalista de circunstância, que na autocrítica dos seus limitados méritos técnicos, cedo soube encontrar a oportunidade para convidar um outro excelente guitarrista que o substituísse – o Carlos Carvalho – de molde a poder dedicar-se àquilo para que, de facto, parecia vocacionado: a organização, em moldes empresariais, do Quinteto Académico, conferindo-lhe uma marca distintiva na concepção do seu marketing e no aperfeiçoamento da sua operação comercial.
Foi um processo firme mas sereno, em que a fasquia de exigência se foi ampliando, o ritmo de ensaios multiplicando e o amadorismo estudantil esmaecendo.
Talvez por isso, talvez porque o dispêndio de tempo e as novas circunstâncias não fossem compatíveis com as exigências paternas e a pressão dos exames, tivesse que ocorrer o inevitável: ficou intacta a amizade, mas os demais fundadores do Quinteto sentiram ser o momento de dar a oportunidade a novos músicos.
E foi assim que músicos como Pedro Osório, no piano, Jean Sarbib, no baixo e Adrien Ransy, na bateria, se integraram nessa segunda formação do Quinteto Académico.
Ainda “Quinteto” mas, de facto, já menos “Académico” e algo mais “profissional”, o grupo alcançou, nesta fase, o expoente da sua notoriedade, guindando-se a cabeça de cartaz nos mais importantes eventos musicais da época e transformando-se em presença obrigatória em todas as festas de finalistas, liceais ou universitárias, de norte a sul de Portugal.
Foi esse o ciclo que marcou a gravação do disco “Train”, bem como a autoria e gravação da banda sonora de dois filmes de António Macedo: “Domingo à Tarde” e “Sete Balas para Selma”.
E viria a ser esse, também, o inexorável ciclo em que o criador se consome na criatura: a fama do Quinteto Académico era de tal modo projectada no protagonismo dos seus músicos que foi inevitável eles se sentirem tentados a seguir o seu próprio percurso musical.
Uma vez mais ficou intacta a amizade e respeitado o direito à autodeterminação.
Mas, sobre os meus ombros, recaía a responsabilidade – e, porque não, a ambição – de transformar o Quinteto Académico numa constelação de músicos jamais vista em Portugal.
Esgotada que ficava a fase dos melhores músicos nacionais, era chegado o momento de os ir buscar às grandes fontes de referência: a Inglaterra e os Estados Unidos.
E foi então, com 19 anos e a meio do meu curso de Direito, que durante 3 anos percorri os “caveaux” e bares de Londres e Nova Iorque em busca de instrumentistas cujos “curricula”, idade – e aspecto visual – cumprissem o objectivo traçado.
Assim se iniciou a terceira fase do Quinteto Académico +2, na qual apenas se mantiveram o José Manuel Fonseca e o Adrien Ransy. Uma fase em que a necessidade de extensão do naipe de metais, o protagonismo a conferir ao vocalista e o aprofundamento de uma vocação “soul”, exigiram um hepteto de virtuosos músicos profissionais que, de “académicos”, só conservavam o aspecto e o nome.
Seria fastidioso enumerar toda a plêiade de músicos que, nesses últimos 3 anos, se integraram e sucederam no Quinteto Académico +2.
Mas, entre todos eles, será justo recordar Mike Carr, um organista que recrutei no Ronnie Scott Club, em Londres e, à época, era classificado nas tabelas de “Melody Maker”, como o segundo melhor organista do mundo, logo a seguir a Jimmy Smith.
Ou lembrar essa figura ímpar, sedutor impenitente de corações frágeis, que era o Earl Jordan, um “crooner” com uma voz e presença portentosas, que fui descobrir na “big band” da Rádio Caroline, uma estação de rádio pirata, então em grande voga, fundeada numa torre de petróleo desactivada ao largo da costa britânica.
Foi essa a derradeira e inesquecível fase do “conjunto-espectáculo”, protagonizada por um grupo musical cuja imagem visual e impacto anímico em palco, jamais conseguiram ser fielmente reproduzidas em gravações – apesar do êxito do seu disco “Judy In Disguise” e dos múltiplos programas gravados para a televisão.
Era, pois, chegado o momento de sair da arena em glória, até porque, entretanto, eu concluíra os meus 21 anos e, com eles, a licenciatura em Direito, querendo, a partir daí, dar um novo rumo profissional à minha vida.
Face à minha determinação, foi consensual a deliberação de se extinguir o Quinteto Académico +2, logo após num novo contrato a cumprir com uma última digressão a Moçambique e África do Sul.
E assim terminou, sem a erosão da decadência, esse venturoso percurso de 8 anos do Quinteto Académico.
Deixou raízes numa geração que cultivava o prazer da música com uma apetência lúdica que não dispensava o sentido da exigência.
E deixou-me esses tantos bons amigos que continuo a rever em Portugal e outros tantos com quem ainda troco correspondência no estrangeiro.
O que aprendi desse mundo em que vivi, das seduções a que cedi, das tentações a que resisti, das lições que extraí dessa precoce e adolescente experiência de 8 anos como empresário musical, valeram-me mais, ao longo do resto da minha vida, do que as duas graduações universitárias que consegui concluir.
E, talvez por ironia do destino, eis que nas minhas actuais funções de Presidente da Estoril-Sol, responsável pelos seus três Casinos e persistente promotor dos ambiciosos projectos musicais, artísticos e culturais que neles se desenvolvem, muitas vezes me deparo com desafios bem próximos daqueles que, um dia, lá ao longe, já vivi no Quinteto Académico.
Porque, no fundo, a história repete-se e o que somos não muda; o que muda é o que fazemos!
Texto de Mário Assis Ferreira
Imagem cedida por Daniel Gouveia
E foram, ao todo, 32, os músicos que, ao longo dos 8 anos dessa fulgurante carreira do Quinteto Académico por ele passaram e, em sucessivas etapas, o fizeram ascender a um nível qualitativo sem paralelo, à época, em Portugal.
O que nascera, nos idos de 61, como uma diletante experiência de quatro amigos e colegas do liceu – o Daniel Gouveia, o Artur Pinto, o Silva Duarte e eu – logo se viria a transformar, após o ingresso do José Manuel Fonseca e do seu saxofone, num fenómeno de popularidade em que, – sobretudo nesses primeiros tempos, – nem sempre a qualidade musical estaria à altura da reputação alcançada.
A começar por mim, incipiente guitarrista e vocalista de circunstância, que na autocrítica dos seus limitados méritos técnicos, cedo soube encontrar a oportunidade para convidar um outro excelente guitarrista que o substituísse – o Carlos Carvalho – de molde a poder dedicar-se àquilo para que, de facto, parecia vocacionado: a organização, em moldes empresariais, do Quinteto Académico, conferindo-lhe uma marca distintiva na concepção do seu marketing e no aperfeiçoamento da sua operação comercial.
Foi um processo firme mas sereno, em que a fasquia de exigência se foi ampliando, o ritmo de ensaios multiplicando e o amadorismo estudantil esmaecendo.
Talvez por isso, talvez porque o dispêndio de tempo e as novas circunstâncias não fossem compatíveis com as exigências paternas e a pressão dos exames, tivesse que ocorrer o inevitável: ficou intacta a amizade, mas os demais fundadores do Quinteto sentiram ser o momento de dar a oportunidade a novos músicos.
E foi assim que músicos como Pedro Osório, no piano, Jean Sarbib, no baixo e Adrien Ransy, na bateria, se integraram nessa segunda formação do Quinteto Académico.
Ainda “Quinteto” mas, de facto, já menos “Académico” e algo mais “profissional”, o grupo alcançou, nesta fase, o expoente da sua notoriedade, guindando-se a cabeça de cartaz nos mais importantes eventos musicais da época e transformando-se em presença obrigatória em todas as festas de finalistas, liceais ou universitárias, de norte a sul de Portugal.
Foi esse o ciclo que marcou a gravação do disco “Train”, bem como a autoria e gravação da banda sonora de dois filmes de António Macedo: “Domingo à Tarde” e “Sete Balas para Selma”.
E viria a ser esse, também, o inexorável ciclo em que o criador se consome na criatura: a fama do Quinteto Académico era de tal modo projectada no protagonismo dos seus músicos que foi inevitável eles se sentirem tentados a seguir o seu próprio percurso musical.
Uma vez mais ficou intacta a amizade e respeitado o direito à autodeterminação.
Mas, sobre os meus ombros, recaía a responsabilidade – e, porque não, a ambição – de transformar o Quinteto Académico numa constelação de músicos jamais vista em Portugal.
Esgotada que ficava a fase dos melhores músicos nacionais, era chegado o momento de os ir buscar às grandes fontes de referência: a Inglaterra e os Estados Unidos.
E foi então, com 19 anos e a meio do meu curso de Direito, que durante 3 anos percorri os “caveaux” e bares de Londres e Nova Iorque em busca de instrumentistas cujos “curricula”, idade – e aspecto visual – cumprissem o objectivo traçado.
Assim se iniciou a terceira fase do Quinteto Académico +2, na qual apenas se mantiveram o José Manuel Fonseca e o Adrien Ransy. Uma fase em que a necessidade de extensão do naipe de metais, o protagonismo a conferir ao vocalista e o aprofundamento de uma vocação “soul”, exigiram um hepteto de virtuosos músicos profissionais que, de “académicos”, só conservavam o aspecto e o nome.
Seria fastidioso enumerar toda a plêiade de músicos que, nesses últimos 3 anos, se integraram e sucederam no Quinteto Académico +2.
Mas, entre todos eles, será justo recordar Mike Carr, um organista que recrutei no Ronnie Scott Club, em Londres e, à época, era classificado nas tabelas de “Melody Maker”, como o segundo melhor organista do mundo, logo a seguir a Jimmy Smith.
Ou lembrar essa figura ímpar, sedutor impenitente de corações frágeis, que era o Earl Jordan, um “crooner” com uma voz e presença portentosas, que fui descobrir na “big band” da Rádio Caroline, uma estação de rádio pirata, então em grande voga, fundeada numa torre de petróleo desactivada ao largo da costa britânica.
Foi essa a derradeira e inesquecível fase do “conjunto-espectáculo”, protagonizada por um grupo musical cuja imagem visual e impacto anímico em palco, jamais conseguiram ser fielmente reproduzidas em gravações – apesar do êxito do seu disco “Judy In Disguise” e dos múltiplos programas gravados para a televisão.
Era, pois, chegado o momento de sair da arena em glória, até porque, entretanto, eu concluíra os meus 21 anos e, com eles, a licenciatura em Direito, querendo, a partir daí, dar um novo rumo profissional à minha vida.
Face à minha determinação, foi consensual a deliberação de se extinguir o Quinteto Académico +2, logo após num novo contrato a cumprir com uma última digressão a Moçambique e África do Sul.
E assim terminou, sem a erosão da decadência, esse venturoso percurso de 8 anos do Quinteto Académico.
Deixou raízes numa geração que cultivava o prazer da música com uma apetência lúdica que não dispensava o sentido da exigência.
E deixou-me esses tantos bons amigos que continuo a rever em Portugal e outros tantos com quem ainda troco correspondência no estrangeiro.
O que aprendi desse mundo em que vivi, das seduções a que cedi, das tentações a que resisti, das lições que extraí dessa precoce e adolescente experiência de 8 anos como empresário musical, valeram-me mais, ao longo do resto da minha vida, do que as duas graduações universitárias que consegui concluir.
E, talvez por ironia do destino, eis que nas minhas actuais funções de Presidente da Estoril-Sol, responsável pelos seus três Casinos e persistente promotor dos ambiciosos projectos musicais, artísticos e culturais que neles se desenvolvem, muitas vezes me deparo com desafios bem próximos daqueles que, um dia, lá ao longe, já vivi no Quinteto Académico.
Porque, no fundo, a história repete-se e o que somos não muda; o que muda é o que fazemos!
Texto de Mário Assis Ferreira
Imagem cedida por Daniel Gouveia
6 comentários:
UUUAAAAUUUUUUUUUUU !
foi com muito agrado que encontrei e adquiri a edicao turca do single "Judy in Disguise"
Pedro Brandao
Espere aí, caro Pedro Brandão, edição turca do "Judy In Disguise" pelo Quinteto ou apenas edição turca do single, "tout court"? E, se sim, por quem?
LT
edicao turca do single com I don't mind no lado B. Quinteto academico +2.
Infelizmente sem capa...mas para dizer a verdade nao sei se esta edicao alguma vez teve (em 68 muitos discos eram editados assim).
posso mandar uma foto. diga-me para onde.
Pedro
Fantástico! A edição portuguesa também é sem capa. Depois da "Penina" chilena, agora o Quinteto turco... Já acredito em tudo!!! Pode mandar, sff, para luistita@gmail.com.
Obrigado e parabéns pela aquisição!
LT
Folgo em saber que o disco esta completo.
como alguem disse...porreiro pa :)
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