sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

GRANDE PRÉMIO DO DISCO


O Grande Prémio do Disco era uma espécie de top (por votação) existente em Portugal em 1965/66.

Foi organizado pela revista "Rádio & Televisão" e pelos programas (excelentes e emblemáticos) da Rádio Renascença, "Enquanto For Bom Dia" e "23ª Hora".

Basicamente, o top funcionava com os votos semanais dos leitores e dos ouvintes (gastei muito selo dos Correios, daqueles do cavalinho, D. Dinis).

Para a história, eis o 1º Grande Prémio do Disco, datado de 11 de Setembro de 1965:

1 - Help! - Beatles
2 - Esquece - Ekos
3 - Capri C'Est Fini - Hervé Vilard
4 - Chove - Conjunto Académico João Paulo
5 - House Without Windows - Cliff Richard
6 - C'Est La Première Fois - Felix Marten
7 - Trains And Boats And Planes - Burt Bacharach
8 - Quand Un Bateau Passe - Claude François
9 - With These Hands - Tom Jones
10 - De Homem Para Homem - Tony de Matos

Como é fácil de ver - aos olhos de hoje - o povo estava mesmo baralhado quanto às suas opções. Nem sequer a indústria discográfica se equipava com singles para as suas estratégias de promoção e de marketing.

Em suma, a indústria discográfica era naquela altura praticamente inexistente.

Os Beatles aguentaram 5 semanas no primeiro lugar (quem disse que os portugueses preferiam os Rolling Stones aos Beatles? Nesta lista de 50 canções, a melhor coisa que os Stones conseguem é um 14º lugar com "Satisfaction"), tendo sido substituídos no cimo, a 16 de Outubro de 1965, por "Hully Gully do Montanhês", do Conjunto Académico João Paulo ("Satisfaction" só tinha subido para 7º).

Como o povo precisava de arejar - para esquecer a guerra colonial e outras agruras do regime ditatorial - o Teatro Monumental, em Lisboa, graças à visão de Vasco Morgado, funcionava como uma espécie de catedral do ié-ié.

Naquela altura, desempenhou o mesmo papel que, anos mais tarde, pertenceu ao Coliseu ou ao Dramático de Cascais (este já foi abaixo).

Ainda antes do famoso Concurso Ié-Ié, de que os Claves sairiam vencedores, o Teatro Monumental, em Lisboa, abriu as suas portas à música no dia 02 de Fevereiro de 1966.

A ideia foi a de festejar o ano de 1965 em termos musicais, uma espécie de NME Pollwinners Concert (que, diga-se de passagem era sempre dominado pelos Beatles).

Segundo relato da época, a festa do Monumental foi um "autêntico espectáculo de ídolos, em que algumas das mais recentes e promissoras vedetas do disco colheram os aplausos delirantes de uma vasta e entusiasmada audiência".

Apresentado por João Martins e Carlos Cruz (então criança), o espectáculo foi uma "sucessão trepidante de quadros musicais, nas vozes e nos instrumentos de alguns dos nossos mais jovens e apreciados intérpretes".

Actuaram o Conjunto Mistério, os Claves, os Rocks e os Sheiks - "aplaudidos com igual calor" - mas a pena do repórter escorrega para os Rocks - uma "espectacular exibição do magnífico conjunto angolano, com um vocalista impressionante que electrizou a assistência".

Além destes ritmos modernos, cantaram também Teresa Tarouca e João Ferreira-Rosa.

Não percebo como não foram corridos do palco, mas o repórter no local dá conta de que "a plateia soube ouvir fado com silêncio e nostalgia, como antes tinha acompanhado com delirante vibração as canções yé-yé".

A segunda parte do espectáculo foi preenchida com a entrega de 18 prémios, 10 dos quais para o top 10 do Grande Prémio do Disco, 5 para editoras de discos portugueses, como agradecimento pela colaboração prestada ao referendum (sic), e que foram a Valentim de Carvalho, Rádio Triunfo, Arnaldo Trindade & Cª, Philips Portuguesa e Telectra, e os restantes aos autores e à orquestra da canção classificada em primeiro lugar ("Hully Gully do Montanhês", do Conjunto Académico João Paulo).

A terceira e última parte do espectáculo foi preenchida por Nino Ferrer, "cançonetista-sucesso de França", que se apresentou com o seu "conjunto privativo Les Gottamou".

Para o escriba de serviço, foram o "corolário arrebatador de um espectáculo sensacional".

Para a história aqui fica o Top 10 da classificação final do Grande Prémio do Disco-1965:

1 - Hully Gully do Montanhês - Conjunto Académico João Paulo
2 - Não Sei De Ti - António Calvário
3 - Chove - Conjunto Académico João Paulo
4 - Help! - Beatles
5 - Esquece - Ekos
6 - Nem Eu Nem Vocês - Simone
7 - Sonha - Madalena Iglésias
8 - (I Can't Get No) Satisfaction - Rolling Stones
9 - Viens Ma Brune - Adamo
10 - Yesterday - Beatles

Colaboração de Luís Pinheiro de Almeida

10 comentários:

Jack Kerouac disse...

Bom texto, boa história, mais um bom contributo para dar a conhecer mais um pouco da história da música ligeira Portuguesa dos 60s. Mas também muito interessante é o DVD que serve de ilustração ao texto, onde arranjaste isso ?

ié-ié disse...

Para te dizer a verdade, não sei onde o DVD pára...

LT

josé disse...

Óptimo texto para dar uma ideia a quem não viveu esse tempo, do que se passava.

O melhor, porém, seria repescar essas sonoridades em disco. As portuguesas, francesas e outras que não as anglo-saxónicas porque essas são bem conhecidas.

E repescar ainda uma palavra sensacional: exactamente, SENSACIONAL.
Era uma palavra dos anos sessenta e que merece represtinação no vocabulário corrente.

Anónimo disse...

Mais uma vez pergunto:

Se os Beatles eram tão "mal amados" em Portugal como é que conseguem ter o nº 1 no primeiro top português

Anónimo disse...

Quem é o autor da notícia ?

Presumo que não seja mr. ié ié pois não indica "Colaboração de LPA"

:)

filhote disse...

Não fazia ideia deste TOP nem dos concertos lisboetas a la NME Poll Winners Awards Show.

Curiosamente, ontem conversava com o Gabriel dos Autoramas sobre os discos de Nino Ferrer... há bruxas...

Bravo, Ié-Ié! O blogue inicia o ano confirmando a sua relevância no firmamento cibernáutico (bela frase... eheheh...)!

O DVD, Kerouac? Também tenho. De antologia. O show dos Beatles em 1964 é demolidor!

josé disse...

Repristinação é que é.

Um termo jurídico, mas de significado preciso.

ié-ié disse...

Do Direito, o que gosto é do "obnubilar" que ainda hoje utilizo...

Ou da "enfiteuse" que contraponho nas consultas médicas quando me vêm com todos aqueles termos médicos.

"E a srª drª sabe o que é a enfiteuse?". Trocam logo tudo por miúdos...

LT

ié-ié disse...

Os Beatles não eram lá muito bem queridos, mas havia sempre uns fãs que exageravam nas missivas ou nas chamadas telefónicas...

LT

ié-ié disse...

"sensacional", "bestial"...

curioso que, tal como o "robalo", o dicionário oficial da Academia das Ciências de Lisboa também não contempla "repristinação"... "obnubilar" está!

LT