domingo, 20 de setembro de 2009

O QUE É FEITO DOS PIQUENIQUES?


Quem me habituou à prática dos piqueniques foi um avô que eu tive, depois substituído, ao longo dos anos, por um grande amigo que, por essas alturas, nos meus vinte e poucos, sabia de piqueniques como ninguém e tinha uma companheira fazedora de sanduíches de vários andares e de outras comidas portáteis que eram autênticos pitéus.

Calcorreei muitos caminhos, deitei-me na caruma, sesteei à sombra de olorosas árvores, trepei a rochas das quais se descobriam horizontes de deixar sem ar o mais indiferente à magnificência de certas paisagens, juntei pedras que eram esculturas “encontradas”, como eu lhes chamava, carreei para casa plantas, pedras, conchas, enfim, tudo o que podia ajudar a relembrar esses excelentes passeios e a aligeirar um pouco estas muralhas de livros que me rodeiam. E tudo isto se fazia – com excepção de percursos ferroviários sem interesse – a pé.

Outro dia, com uma amiga, quase que repeti um piquenique dos tempos em que era jovem. Soube-me tão bem! O nosso combustível era a excelente conversa que muitas vezes mantemos. E, como sabeis, não há nada melhor que ar puro, sol, andamento à vontade do corpo e uma boa conversa para levantar o moral. Chegados ao sítio que nos propúnhamos atingir – porque havia, naquele passeio, um sítio a atingir – sentámo-nos nuns banquinhos de pedra, daqueles em que as pessoas ficam frente a frente, olhámos uns painéis de azulejos que a minha amiga já conhecia e eu não, levantámo-nos, contornámos um vasto tanque de pedra e por ali ficámos um pouco, a mirar e a remirar a bela construção. Depois voltámos paulatinamente ao ponto de partida e, com excepção do lixo esparso (plástico, latas de refrigerantes vazias etc.) que, a um canto ou a outro, sempre aparece, sentimos que tínhamos ganho a tarde. Claro que exprobámos aos humanos-em-geral o seu desleixo, a sua falta de respeito pelo outro, a sua incivilidade. Abandonar em qualquer lado o lixo? Um piqueniqueiro que se preza jamais que se preza jamais o fará. Longe, ao fundo, passavam enlatados por uma estrada. Quando nos aproximámos, vimos as caras das pessoas e foi terrível. Eram como lixo dentro de contentores, um lixo que pensasse de si próprio que era um luxo.

Então percebemos que a nossa boa disposição – se não tivéssemos inteligência – acabaria logo ali. Olhámos um para o outro e conseguimos salvar o resto da tarde largando duas bem estaladas gargalhadas.

Sim, que é feito dos verdadeiros piqueniques?

Alexandre O’ Neill em “Uma Coisa Em Forma de Assim”

A ilustração é um quadro de Édouard Manet, “Le Déjeuner Sur L’Erbe”

Colaboração de Gin-Tonic

2 comentários:

JC disse...

"Apoiado pela ideia; porra para a gramática": sur l'herbe, com "H".
Quanto ao que tinha a dizer s/ picnics (que os faço c/ frequência), já o disse, e não repito, para o Gin-Tonic não vir com frases amigáveis para disparatadas (ele sabe...)
Abraço

JC disse...

mas disparatadas