terça-feira, 4 de agosto de 2009

MARES, MARÉS, FARÓIS E MARINHEIROS 01


Com os cotovelos da camisola gastos por se apoiar no balcão de linóleo, levantando a caneca de lager, e os fundilhos dos jeans puídos por se suster no banco do costume, à espera da tarde ou da noite de inopinada maravilha, decidiu que se impunha, que diabo, radicalizar a mudança de vida. Persistia a chuva de Aberdeen que molha profundamente, ainda quando não parece cair, e tardava a Primavera mais do que seria admissível, pondo a doer, de tão imobilizadas, as ubiquas lâmpadas de vapor de mercúrio.

Este é o começo de “O Último Faroleiro de Muckle Flugga” de Mário Claúdio, um livrinho da interessante colecção “Mares” publicada durante a “Expo 98”.

A imagem é o Farol de Point Reys, California que deveria ter aparecido na “Crónica Americana “ do Luis Mira, publicada, aqui, no dia 30 de Junho.

Este escriba dá a mão à palmatória e confessa a sua fraqueza por não ter resistido à tentação de ter publicado uma outra foto da viagem de Luis Mira. Mas aquele farol, envolto num belissimo nevoeiro, também uma lindíssima fotografia, diga-se, foi um chamamento forte de mais, ele que também gosta de faróis, principalmente quando envoltos em nevoeiro, a lembrar o Farol do Cabo da Roca, percebes apanhados pelo Zé Puto nas falésias da Praia da Ursa, garrafas de “Beira-Mar” estupidamente geladas, um mundo de afectos, cumplicidades silenciosas, o pai ainda vivo.

Mas o chamamento por faróis já vem de longe, quando leu um texto sobre as Berlengas em “Os Pescadores” de Raul Brandão e ficou a pensar que um farol seria um óptimo sítio para viver: “Os homens devem ser felizes diante deste espectáculo sempre igual e sempre renovado.”

Reposta a legalidade poética e histórica da crónica, renovando os pedidos de desculpa aos viajantes do “Ié-Ié”, ao seu editor, ao próprio Luis Mira, entendeu ele deixar-vos com o final do livro do Mário Cláudio. Se não leram o livrinho tentem fazê-lo, é um belíssimo texto em cinquenta páginas escrito e talvez fiquem a gostar de faróis, ver o sol desaparecer e poderá acontecer que vos apareça o raio verde, chapelada ao velho Júlio Verne, e deixem-no aos que não o conhecem e quiserem conhecê-lo.

Fechou Peter Macfallen o humedecido canhenho, arrumou-o cautelosamente na prateleira por cima do leito, arrumou-o cautelosamente na prateleira por cima di leito, colocando-o no meio dos restantes volumes. Abriu uma garrafita de “Highland Clan”, a exclusiva que lhe sobrava, mordiscou um biscoito, e ia iniciar um longo bocejo, quando um toque repetido lhe sobreveio. Prestando tento ao emissor, percebeu que não era daí, mas do topo da torre, que o sinal lhe chegava, estruturando-o como uma cifra assim, “tip tap, tip tap, tip pap tip. Alçou o olhar ao tecto que o candeeiro de pé-de-lagarta não bastava a iluminar, e vislumbrou um pequeno gancho, caiado como a totalidade da construção, o qual miraculosamente poderia servir a que nele se enfiasse a corda providencial.

Colaboração de Gin-Tonic

1 comentário:

filhote disse...

E "ele", por certo, sente que Jesus, o Jorge, será o farol que orientará as "papoilas saltitantes" pelo nevoeiro instalado, de épocas e épocas de ilusões...

Será que é desta?