domingo, 13 de julho de 2008

A NIGHT IN THE LIFE


Parecia o último concerto da vida de Neil Young, tal o empenho e a pujança com que atacou a guitarra. Como se fosse a derradeira vez.

Chegou a ser anacrónico: Neil Young já tem 62 anos, está exageradamente gordo e não tem graciosidade alguma nos seus movimentos epilécticos em luta feroz com a guitarra.

Não obstante, é uma imagem ternurenta que fica, uma imagem de amor de um homem solidário para quem o tempo não conta e que goza e se satisfaz hoje em dia com o palco como se estivesse ainda com os Buffalo Springfield.

Vê-lo agachado à guitarra, tentando dominá-la, de costas para o público, mas de frente próxima à coluna de som, com espasmos por todo o corpo, desajeitado, é um espectáculo-extra.

Ou, no final, quase destruindo a guitarra em "A Day In The Life", dos Beatles. Pareceia o puto do Pete Townshend!

Já não me lembrava de Neil Young assim, uma fera em palco, não poupando energias, dando tudo. Fiquei (positivamente) surpreendido.

Uma das coisas que mais me intrigou é como é que Neil Young consegue retirar da mesma guitarra e quase em simultâneo sons completamente diferentes, antagónicos. Sim, como é possível?

Por isso se perdoam as longuíssimas dissertações de guitarra - mais parecia um David Gilmour do grunge - eximiamente executadas é certo, mas por ventura fastidiantes para quem não estivesse para ali virado.

Da velha escola e à guitarra acústica deliciou com "Oh Lonesome Me", "The Needle And The Damage Done", "Heart Of Gold", "Old Man", "Back To The Country", "Words", "Mother Earth", mas se me permitem dois highlights, já os escolhi: "Rockin' In The Free World" e "A Day In The Life".

Porquê?

Porque, provavelmente, terão sido as duas canções com maior comunhão com o público que, diga-se, foi bem diverso do de Bob Dylan, na véspera: agora mais portugueses e menos estrangeiros e de classes etárias mais elevadas.

Uma última nota: brigadas das Finanças, tipo desmancha-prazeres, andaram a chatear o negócio do Festival - bem os vi em interrogatórios na Carbono e em stands de t-shirts, pelo menos...

Apetece-me ser demagógico: porque não vão chatear os ricos?

No exterior, a Polícia - aquela mais musculada - andava a chatear quem vendia t-shirts a 10 euros, mas ignorou quem no interior, oficialmente, extorquia 30 e 35 euros por cada uma...

Ah! O concerto foi no sábado à noite, no terceiro e último dia do Festival Optimus Alive! 08, no Passeio Marítimo de Algés (Oeiras).

Ainda vi Donavon Frankenreiter que, perdoem-me os fãs, pareceu-me um "Jack Johnson dos pobres".

Alinhamento do concerto (fonte: meu conhecimento e BLITZ):

01 - Love And Only Love (Ragged Glory, 1990)
02 - Powderfinger (Rust Never Sleeps, 1979)
03 - Spirit Road (Chrome Dreams II, 2007)
04 - Cortez The Killer (Zuma, 1975)
05 - Rockin' In The Free World (Freedom, 1989)
06 - Oh, Lonesome Me (After The Gold Rush, 1970)
07 - Mother Earth (Natural Anthem) (Ragged Glory, 1990)
08 - The Needle And The Damage Done (Harvest, 1972)
09 - Unknown Legend (Harvest Moon, 1992)
10 - Heart Of Gold (Harvest, 1972)
11 - Old Man (Harvest, 1972)
12 - Get Back To The Country (Old Ways, 1985)
13 - Words (Between The Lines Of Age) (Harvest, 1972)
14 - No Hidden Path (Chrome Dreams II, 2007)
15 - A Day In The Life (Sgt. Pepper's, Beatles, 1967)

Foto de Teresa Lage

25 comentários:

filhote disse...

Deve ter sido valente... vi o concerto de Neil Young em Vilar de Mouros e foi demolidor... se bem que antes da operação à cabeça... mas é sempre bom, não é verdade?

ié-ié disse...

Boa, demolidor é um bom termo para definir o concerto de Young. Eu tinha-o visto em 93 com os Booker T & the MGs e não era nada disto.

LT

josé disse...

Se foi como em Vilar de MOuros - e acredito que sim, porque Neil Young, na acústica, só tem paralelo na...eléctrica, ahahahah- então foi demolidor.

Um grande artista, este Young, um dos meus ídolos musicais de sempre..


Mas...já vos falei do Almada, não falei? Em Viana?

Estou sem palavras, tal a categoria do concerto que deu. Todos os presentes, sem excepção e sem condescendência o reconheceram.

paulo disse...

Não deixa de ser curioso como A Day In The Life foi como que redescoberta quase em simultâneo por McCartney e por Neil Young (que são, ao que parece, muito amigos)...

Zeca do Rock disse...

Alguém pode explicar a um lisboeta que não vai a Portugal há mais de 10 anos, onde fica o Passeio Marítimo de Algés? Do lado da antiga praia, para lá da linha de combóio? No local onde antigamente ficavam os Pavilhões Catavento, etc? Agradeço.

ié-ié disse...

O Passeio Marítimo de Algés fica exactamente, ou quase exactamente, entre a estação de comboios da CP e o rio. Acho que ainda é rio, por isso deveria ser chamado Passeio Fluvial de Algés, mas nós sabemos como o Isaltino é megalómano! Não muito longe está a belíssima Torre de Controlo da APL (Administração do Porto de Lisboa), desenhada por Gonçalo Byrne.

LT

ié-ié disse...

E estamos todos ansiosos pelo relato do concerto de José Almada em http://lojadeesquina.blogspot.com/

LT

Zeca do Rock disse...

Obrigado pela informação. É, realmente no chão da antiga Praia de Algés que, quando eu era criancinha, rivalizava com a Praia da Trafaria em número de turistas...

filhote disse...

Na verdade, Neil Young costuma ser assim demolidor quando acompanhado pelos Crazy Horse!

Bobbyzé disse...

Vamos là a vêr se o gajo nao se balda ao nosso encontro, marcado para o dia 15 de Agosto, aqui em Colmar. E que, tratar com americanos,tornou-se bastante imprevisivel!!!Na ultima entrevista que fiz com o JAMES BROWN, um dos gajos do staff chegou a pedir-me 10 000 dolares por esse encontro exclusivo!!!Crazy, nao? Uma garrafa de Vinho do Porto (20 anos) conseguiu resolvêr esse ridiculo obstàculo!

filhote disse...

E o vosso Top 5 de LPs do Neil Young? Por onde anda?

Aqui vai o meu:

1. "After the Gold Rush"
2. "Harvest"
3. "On the Beach"
4. "Live Rust"
5. "Harvest Moon"

Neste momento, instigado pelo texto do Ié-Ié, estou a ouvir "The Needle and the Damage Done".

josé disse...

Top Five Neil Young:

1.After the gold rush
2.Harvest.
3. Comes a time
4. Rust never sleeps
5. Tonight´s the night.

6. On the Beach.

josé disse...

The Needle, ouve-se e vê-se bem no You Tube, com as milhentas tentativas de cover que por lá andam. Algumas bem razoáveis. Tomara eu, tocá-la assim...

Por outro lado, a melhor versão, em vídeo, será do Massey Hall ou uma de 1971, que aparece no You Tube, em que Neil Young parece em estado de graça na voz e no modo de tocar.

Impecável.

ié-ié disse...

E eu estive a ouvir "Comes A Time" e "Chrome Dreams II" e as diversas versões de "Rockin' In The Free World".

Vou publicar o alinhamento.

LT

ié-ié disse...

Não ando muito longe dos vossos apetites, mas, mais uma vez, vejo que um álbum de Young que eu adoro, "Old Ways", não recolhe muitas mais apreciações. Também gosto do "Hawks & Doves", "This Note's For You" e "American Stars 'N Bars".

LT

josé disse...

Então, vamos lá até aos dez mais que Young merece:

7. Zuma
8. American Stars and Bars
9. Live at the Massey Hall
10.Chrome Dreams I ( pirata)

josé disse...

Old Ways, já nem consigo ouvir, como ouvi quando saiu. Anos oitenta que prefiro não recordar nessa música, mas noutras...

filhote disse...

Ok, sem fazer favor ao Ié-Ié que eu também adoro o citado LP Country de Neil Young...

06. Everybody Knows this is Nowhere
07. Old Ways
08. Zuma
09. Comes a Time
10. Tonight's the Night

Como andamos próximos nesta matéria, José!

E, Ié-Ié, também fartei-me de ouvir "Hawks and Doves".

Voltando a "Old Ways", "Are there any More Real Cowboys" foi das primeiras canções que aprendi a tocar na guitarra, cantando e tocando harmónica também. Na época era uma proeza!!!

ié-ié disse...

A conclusão que tiro é a de que parece que todos nós gostamos mais de Neil Young acústico ou perto disso, do que os experimentalismos na electrónica ou os rocks mais complexos.

Ah! Ainda nos falta falar daquelas coisas lindas como "Helpless", "Teach Your Children", etc.

Uma das versões que mais gosto em Neil Young é "Four Strong Winds".

LT

josé disse...

Esqueci o Everybody Knows this is nowhere, o que é imperdoável. É um dos melhores, claro.

Quanto às versões acústicas: um dos motivos por que gosto de guitarra acústica, deve-se ao estilo de Neil Young.
Ando a aprender finger-picking e por vezes vou ao You Tube espreitar versões. De Blackbird por exemplo. Ou de Southwestern Pilgrimmage, de Michael Murphey que ando a tentar imitar, porque me parece uma canção perfeita nesse estilo. Ou ainda Never going back again, dos Fleetwood Mac.

Voltando a Neil Young: as melhores canções do Loner, são manifestamente simples nos acordes utilizados ( como as do José Almada, a propósito). E no entanto, conseguir tocá-las como ele as toca, já é uma arte em si mesma.
Dedilhar The Needle, ou Tell me why, outra maravilha, em perfeita harmonia vocal, é o máximo a que aspiro como guitarrista amador.
Mas tocar bem, com todas a cordas a soar justo e do modo como Neil Young as consegue por a soar.

Por outro lado, as canções de Comes a Time, apanharam-me em 1978, numa época de luxo emocional.

Four Strong winds é uma pequena maravilha de som acústico e Look out for my love, outra.

filhote disse...

Penso exactamente da mesma forma, José. E sinto-me de certa forma feliz por ser capaz de tocar "The Needle and the Damage Done" ou "Blackbird" (esta é mais difícil). E também "Drifter's Wife" do J.J. Cale... conhece?

E agora estou feito! O José lembrou-me uma canção que amo, mas nunca toquei... "Never going back again" dos Fleetwood Mack"!

filhote disse...

E já agora, José, não deixe de ouvir o último disco de Lindsey Buckingham, "Under the Skin" (Reprise, 2006). Magistral. Quase totalmente acústico, até contém uma versão sublime de "I Am Waiting" dos Stones...

filhote disse...

Errata: Mac, e não Mack, obviamente.

josé disse...

Num dvd da Eagle entertainment, sobre o making of de Rumours, Lindsay aparece a tocar Never going back, nessa altura ( em que se fez o making of e não o disco). A diferençá e abissal, porque Lindsay perdeu entretanto, a amplitude vocal.

Mesmo assim, a variação de acordes em Never going back, a seguir ao primeiro coro, é magistral.

Mas, tocar mesmo a sério, para mim, seria conseguir dedilhar, Black Mountain rag.
Experimentem escrever no You Tube esse nome associado a Arlo Guthrie e vão ter uma surpresa.
Ou escrever no You Tube, simplesmente Jerry Reed e vê-lo a tocar essa e outra como City of New Oeleans daquele Arlo.

Fantástico. Quero tocar assim, quando for grande.

NS disse...

Luis,

Este sim valeu a pena! Entra directamente para minha galeria de melhores concertos!

Depois daquela actuação até tive receio de não gostar de Ben Harper :-) Ainda assim esteve bem, sem deslumbrar. O momento alto foi também um "dueto" com o público a fazer a vez da Vanessa Mata na interpretação de «Good Luck».

http://www.youtube.com/watch?v=LQujTtjEv58