sábado, 19 de julho de 2008

ANTÓNIO PINHO FALA SOBRE CAPA


A simples apresentação deste EP da Filarmónica Fraude deu origem a uma interessante discussão sobre o olho de peixe e a inspiração do fotógrafo.

Filhote puxou a brasa à sua sardinha e trouxe à colação uma colectânea inglesa dos Rolling Stones.

Sempre mais cerebral e calculista, Muleta foi buscar o primeiro álbum dos Byrds.

Eu, como não tenho opinião, fui directo à fonte, a uma das fontes, e perguntei a António Pinho, co-autor com Luís Linhares, deste EP:

quid iuris?

Eis a resposta:

Sou meio desligado de memórias. Gosto de recordar as coisas, mas retenho-as mal, não fiz arquivo, até discos meus me faltam. Agora compro-os para mostrar aos netos (outro que já é avô e eu ainda não! - nota do editor).

Acho-lhes graça, dou-lhes ainda o valor de que são merecedores, mas vejo e oiço os defeitos. Coisa que nunca senti foi o peso dos anos, por isso continuo a escrever e cada vez para os mais novos, para a infância, patamar de que mais me sinto próximo por entender cada vez menos os adultos.

Cabe aqui frase antiga do Pedro de Freitas Branco e minha (António Pinho e Pedro de Freitas Branco formaram uma dupla de autores de sucesso de livros infanto-juvenis - nota do editor): "Não nos identificamos com aqueles a quem chamamos de adultos profissionais". São uns chatos e chatos são piolhos e piolhos são miniaturas do que é "ser".

Matadas algumas saudades interiores, vamos ao assunto:

Capa de Animais de Estimação. Confesso: ao ler o teu email, tive ideia de que era a que exibes no blogue, mas não totalmente a certeza. Lembro: pela parte que me terá tocado na escolha da foto para capa, não veio seguramente a ideia de seguir os Stones, porque nunca fui fã dos ditos (nem 1 só disco deles tenho) e porque, com certeza, nem conheceria a capa. Também não posso afirmar se alguém da banda terá sugerido a influência.

Sobre a referência aos Byrds, fui verificar, pois tenho quase tudo... lá estão eles vistos através do mesmo olho de peixe.Também não me lembro se alguém na altura pensou nesta capa.

Lembro, sim, que o fotógrafo terá sido o Nuno Calvet (pelo menos, ele viria a fazer a foto interior do grupo em EPOPEIA, no estúdio que tinha nessa época ali perto da Faculdade de Ciências)...

Com medo de imprecisões, acabo de ligar ao Luís Linhares: afinal terá sido o Eduardo Gageiro (ele ainda hesitou entre este e o Augusto Cabrita: inclino-me mais para Gageiro, de quem tenho 2 pretos e brancos dos Heróis do Mar, quando produzi a capa para MÂE).

Segundo o Linhares a coisa terá sido assim: a Phillips contratou o Gageiro (vamos supor que foi mesmo ele, mas podes reconfirmar) para foto da capa; este trabalhava no Século; não tendo tempo para se deslocar, mandaram-nos ao jornal; o fotógrafo saiu e foi mesmo ali, á porta do matutino.

Aposto agora: foi uma banal foto de grupo em que os 7 apenas se plantaram no granito da fonte mirando o olho do goraz.

Concluo: sendo na altura a lente olho de peixe, uma novidade, estou em crer que terá sido mesmo o Gageiro a ter a ideia.

Concluo ainda: pasmo por ver que há malta que perde tempo com estes pormenores. Diz-me o Linhares que na Nova - onde dá aulas de Etnomusicologia - um aluno/amigo de 20 e poucos anos, especialista em música do sec XIX, há pouco tempo o interpelou desta forma: "Ó meu sacana, então tu eras da FF e não dizias nada?!".

Se calhar toda esta memória é mesmo importante, eu é que não via; ou faltar-me-ão lentes olho de peixe nos óculos?


Grande abraço

António

11 comentários:

gin-tonic disse...

Não queria ser muito contundente mas: se as gentes que andaram a fazer música, discos, etc., estiveram por dentro da coisa, sentiram as dificuladades que tiveram para editar discos, etc. não sabem, minimamente, como foi concebida uma capa de um disco, como é que alguém um dia pode fazer a história?
Há aqui laivos de algum leviandade que me deixam chateado, mesmo muito chateado.
Claro que uma situação destas necessitaria de um outro tipo de abordagem que, obviamnte não cabe num simples comentário que no fundo mais não é de que um lamento.

gin-tonic disse...

Já agora, António Pinho: estas coisas são MESMO IMPORTANTES!

josé disse...

Absolutamente importantes, para quem cultivou os mitos e lendas que formaram a infância e adolescência.

Há artistas que não percebem isso. O que fazem, produzem e lançam ao mercado, toma uma dimensão diversa da concebida originalmente pelo próprio artista.

E é nessa dimensão que o artista perde o direito à obra. Não perde os direitos que vão parar aos direitos de autos, mas perde o direito a coleccionar todas as belezas e maravilhas que a sua música provoca.

O caso de António Pinho e Nuno Rodrigues, dois dos maiores heróis da nossa música popular, meus ídolos absolutos pelo que produziram musicalmente, é exemplar.

Obrigado por existirem e terem feito o que fizeram, pázinhos!

josé disse...

O vosso talento, não apareceu apenas do vosso trabalho. Nasceu convosco.

Nessa parte é que agradeço o nascimento. A outra, aprecio e louvo o esforço.

E este blog está cada vez melhor, já me esquecia de dizer.

filhote disse...

Uma provocação de um adulto não profissional, ou não se chamasse ele filhote:

De facto, António Pinho não tem um único disco dos Stones, e tem quase tudo dos Byrds. Confirmo. Porém, quando subiu ao palco do Teatro Monumental com os G-Men para tocar bateria no Campeonato Ié-Ié, a canção interpretada foi "Satisfaction" dos Stones, e não "Mr. Tambourine Man" dos Byrds...

Rsrsrsrsrssrsrsrsrsrsrsrsrsr

Muleta disse...

bom, para fechar, e puxando a brasa à minha sardinha: desconhecia de todo a capa dos stones a que o filhote se refere. mas a dos byrds era conhecida cá em Portugal, pois saiu em LP e julgo que também terá sido aproveitada para um ep.
ergo, era de todo provavel que o gageiro tivesse tido mais influência da capa dos byrds que dos stones, uma vez que daquele album só conheço a capa que o titá mostrou.....
o pinho, quando falei com ele por causa do dicionario da musica portuguesa, confessava que nao tinha o epopeia.... eu cá tenho em vinil...

filhote disse...

Claro que a inspiração da capa pode ter surgido do "Mr. Tambourine Man" dos Byrds... não ponho isso em causa... esta pseudo-polémica das capas foi mais uma brincadeira que outra coisa...

Porém, caro Muleta, como é que não se lembra do LP "Big Hits" dos Stones? Foi, de longe, o LP mais vendido da banda em toda a década de 60, e, segundo o meu pai, fazia furor na época, com aquelas fotos fantásticas no interior...

Muleta disse...

filhote, se calhar nao me exprimi bem: claro que conhecia esse disco dos stones, mas nao com essa capa do olho de peixe. aliás tenho esse disco, com a capa que o luís titá publicou, na brincadeira...

ié-ié disse...

A PEDIDO DE ANTÓNIO PINHO:

Olá, Filhote, 'tás bom por aí?... Tens razão. No Monumental os G-Men tocaram "Satisfaction" e não "Tambourine Man". Mas, conhecendo-me como me conheces,
entenderás que um gajo que criou um grupo e lhe deu um nome tão ridículo quanto este, só poderia estar tão imaturo para se apresentar a concurso, pensando marcar pontos com a escolha de reportório.
G-Men?... Hoje riríamos desalmadamente com um nome destes.

E depois, deixa-me que te diga o que igualmente já sabes: não ser um fã dos Stones (e muito menos longe do estado febril que apresentas enquanto tal), não equivale propriamente a rejeitar tudo o que possam ter feito.

E aqui chegado, não hesito em dizer-te: o que nos últimos muitos anos sai daquele grupo é uma merda. Já nos primórdios,
fizeram algumas canções bastante boas... o que não me levou, ainda assim, a comprar um disco completo.

Termino: entre nós, desgostos não se discutem; mas gostos - e temos muitos, felizmente, em comum, sempre se discutirão, e muito bem.

PS- encontrei hoje os teus filhos no Festival do Canal Panda. O puto herdou a tua cara. E terá a herdar uma excelente colecção stoniana de vinis. Tiro-te o chapéu, podia ser melhor, a herança, mas será compensada por outras de muito superior valia que também sei que tens.

Grande abraço, Filhote, do teu amigo
António Pinho

josé disse...

Esta apreciação crítica do António Pinho, sobre os Stones, tem o cunho de outras eras, em que as coisas, ou eram excelentes, ou simplesmente uma "merda". Tal e qual.

Lembro que em 73, quando saíu Innervisions de Stevie WOnder, se colocou em discussão a valia artística do cantor cego, de quem se ouvia na altura, incessantemente e em onda média, Living for the city e ainda He´s a mistra know it all, que aprecio sobremaneira. E fazia-se a comparação com...James Brown.

Uma vez ao mencionar Stevie Wonder no liceu, um colega, atirou-me logo: isso é uma merda!
James Brown é que é.

Eram assim, as dsicussões sobre desgostos, nessa altura.

Pelos padrões da época, a muzak de hoje, é toda uma merda.

E como tal, nem sei para que existem os produtores de tal lixo...

Estou certo ou estou errado?

filhote disse...

Entendido, companheiro Muleta!