terça-feira, 17 de junho de 2008

CONCERT FOR GEORGE (01)


Adivinhava-se uma noite especial no Royal Albert Hall, em Londres. As condições estavam reunidas: uma chuva de estrelas preparava-se para homenagear a memória de George Harrison, falecido exactamente há um ano.

À entrada do “Coliseu” londrino confirmavam-se as expectativas: dezenas de câmaras de televisão, “flashes” das máquinas fotográficas, colunáveis, bilhetes da candonga a mais de 1.500 euros.

Entrava-se e sentia-se o espírito de George Harrison: ausência de “merchandising”, cheiro a incenso, crisântemos para toda a gente (“sempre me senti mais jardineiro do que músico”, disse o ex-Beatle pouco antes de morrer), programas grátis, sóbrios, com fotos a preto e branco e um agradecimento especial ao “nosso” Domingos Piedade, convidado pessoal de Olivia no concerto.

Também a sala respirava a George Harrison (há 10 anos tinha dado no mesmo espaço o seu último concerto em Londres apoiando o Partido da Lei Natural): uma foto gigante do ex-Beatle - a que está na imagem - e um pano com o símbolo de Hare Krishna, nada mais.

“Vamos celebrar a vida e a música de George Harrison”, disse Eric Clapton, irrepreensível organizador e “compère” do espectáculo. “Divertimo-nos imenso nos ensaios, espero que também gostem”.

O maior problema foi a classe etária e sociológica do público. Com mais de 40 anos, muito “in”, com cartão gold do American Express, o público não era propriamente de “curtir”, mas antes de protagonizar um exercício de nostalgia.

Não que o concerto se tivesse ressentido disso, não que se tivesse sentido a ausência dos gritos da beatlemania, mas uma animação qb fez falta.

A música indiana que George Harrison deu a conhecer ao Mundo teve honras de abertura, com Ravi Shankar, já incapaz de tocar, a ceder as honras à filha Anoushka. Em disco pode ser uma “seca” para alguns ouvidos, mas ao vivo, os coros de Hare Krishna, os sons das cítaras, das tablas e dos outros instrumentos orientais soam a divino, prenhe de uma espiritualidade intensa.

No meio, Jeff Lynne concretizou o seu sonho e cantou uma canção beatle, “The Inner Light”, à qual George Harrison tinha emprestado sons indianos.

O primeiro andamento terminou com uma soberba obra indiana, escrita propositadamente por Ravi Shankar para a noite, “Arpan”, uma sábia mistura de sons indianos e ocidentais que terminou em apoteose com o dedilhar blues de Eric Clapton na guitarra acústica.

Foi o agradecimento de Ravi Shankar a George Harrison por este ter introduzido pela primeira vez, em 1965, a cítara no rock ocidental em “Norwegian Wood”. Ravi Shankar devolveu o cumprimento ao introduzir a guitarra ocidental numa peça indiana, tocada magistralmente por um dos melhores amigos do ex-Beatle, Eric Clapton, companheiro de amores e desamores.

Depois veio o rock com as canções de George Harrison nos Beatles e a solo. O palco, sempre de luzes acesas, foi uma “passerelle” para tantas estrelas: Eric Clapton, Jeff Lynne, Jools Holland, Joe Brown, Billy Preston, Gary Brooker, Jim Capaldi, Ray Cooper, Jim Horn, Jim Keltner, Tom Scott, Albert Lee, Chris Stainton, Andy Fairweather Low, Klaus Voorman que desfilaram as canções que estão na memória colectiva, “I Want To Tell You”, “Old Brown Shoe”, “If I Needed Someone”, “Give Me Love, Give Me Peace On Earth”, “That’s The Way It Goes”, “Isn’t It A Pity?”.

Tom Petty e os Heartbreakers tiveram honras de actuação a solo e foram dos que mais vibraram com uma releitura genial de “I Need You”. Dave Grohl, ex-Nirvana e actual Foo Fighter, num camarote, suspirou. Bob Geldof, na assistência, cantarolou. Outros provavelmente fizeram o mesmo, Sir George Martin, Lulu, Bill Wyman, ex-Rolling Stones, Mike Rutherford e tantos outros.

Mas havia ainda mais. A satisfação só estaria garantida com a primeira reunião em palco dos Beatles sobreviventes, desde a separação do grupo em 1970.

Ringo não perdeu o humor ao abeirar-se do microfone: “porque é que toda a gente é mais alta do que eu?”. Cantou “Photograph”, que compôs com George, e “Honey Don’t” e apresentou Paul McCartney. Estava feito o pleno e todo o Royal Albert Hall estava de pé.

Mais humilde do que nunca, McCartney não parou de fazer gestos carinhosos para Ringo que balançeava a cabeça, como no tempo dos Beatles, na sua bateria alta. Atrás de Paul, Dhani Harrison pegava na guitarra tal como o pai. Com cabelo à beatle, parecia que George também estava em palco, como notou McCartney.

Com os mestres em palco – chegou a haver nove guitarristas – foram emocionantes as versões de “Something”, “While My Guitar Gently Weeps”, “My Sweet Lord”, “For You Blue”, “All Things Must Pass”.

Como notou um jornal inglês, para “quiet Beatle”, George Harrison teve sobre si os melhores holofotes.

Luís Pinheiro de Almeida, em Londres

3 comentários:

blog disse...

Alguém sabe por que motivo a Norah Jones não pode o ver pai "nem pintado" ?

ié-ié disse...

Digo mais: é uma das condições para se poder entrevistar Norah Jones. Não falar do pai! Eu acho que tem a ver com o facto de Ravi nunca ter ligo puto à filha!

LT

DANIEL BACELAR disse...

Luis
Muito obrigado por compartilhares com todos nós essa experiência única que foi teres assistido ao vivo a este acontecimento.
Quanto á Norah Jones,temos de concordar que foi uma das melhores e mais inspiradas obras do Ravi,pois é cá um "borracho" que não lhes digo nada!!!!!
Pode mais tarde não ter ligado puto à filha,mas de certeza que "naquela altura" estava bem concentrado!!!Olá se estava!!!