Os dois primeiros filmes que vi nesta sala do nº 16 da Rua Flores Lima foram, no mesmo dia (28 de Novembro de 1975, uma sexta-feira) o desconcertante "Sweet Movie / Um Filme Doce" e o excelente "Johnny Got His Gun / E Deram-lhe Uma Espingarda". Fundado por Pedro Bandeira Freire que recentemente fez sair um livrinho chamado "Entrefitas e Entretelas", que recomendo vivamente, mesmo a quem não goste de cinema, e do qual não resisto a transcrever o episódio da visita à estátua da Liberdade, em Manhattan (o livro está recheado deles, sempre inspirados num determinado filme): ... Subi, como toda a gente primeiro de elevador e depois atirei-me desportivamente à subida dos degraus. Calculo que o que se tem de subir a pé seja o correspondente a um quarto andar e, a pouco mais de meio caminho, comecei a ter alguns sinais de fadiga, com o meu coração já a acusar os excessos pelos quais o fiz passar, mas sempre pensando de forma altruísta que a Liberdade é coisa muito difícil de conquistar como a história o tem provado. Mais do que eu, o arfar de um homem e de uma mulher pró rechonchudo, acompanhados de um filho e de uma filha que, em termos de envergadura, seguiam a inclinação dos pais, metia aflição. Era a muito custo que se arrastavam degrau a degrau, parando de quando em vez. Às tantas o homem não resistiu. Não, não morreu, mas teve para a mulher um sincero desabafo e, em português genuíno e pátrio, exclamou: «Mas que caralho, nunca mais chegamos aos cornos desta puta!»
Já não existe como sala de cinema. Fecharam-no em Novembro do ano passado quando estava prestes a fazer 32 anos de existência. Enquanto durou, principalmente nos primeiros anos, chegou a ter uma progaramção acima da média. Por vezes ouvia-se a acção do filme que estava a passar na sala ao lado, por vezes a projecção tinha soluços, mas desempenhou um papel importante. Mais uma vítima dos cinemas que se instalaram nas grades superficies. Quanto ao livro com um excelente título, “Entrefitas e Entretelas”, é minha opinião que Pedro Bandeira Freire acabou por esbanjar uma estupenda ideia. Abrir cada capítulo com o diálogo de um filme é algo que prometia, mas acabou não corresponder à expectativa. Esperava-se algo mais da sua experiência de cinéfilo e empresário independente, do que uma sucessão de episódios anedóticos, as pequenas com quem andou, os copos que bebeu. O Eduardo Prado Coelho disse um dia que comprava alguns livros pelo prazer de se indignar. Aconteceu-me o mesmo mas só o constatei depois de ter desembolsado os 17,95 euros. Apesar de que, quando estou bem disposto, ir dizendo que nunca me arrependo de comprar um livro. Mesmo quando me desilude!
3 comentários:
Os dois primeiros filmes que vi nesta sala do nº 16 da Rua Flores Lima foram, no mesmo dia (28 de Novembro de 1975, uma sexta-feira) o desconcertante "Sweet Movie / Um Filme Doce" e o excelente "Johnny Got His Gun / E Deram-lhe Uma Espingarda". Fundado por Pedro Bandeira Freire que recentemente fez sair um livrinho chamado "Entrefitas e Entretelas", que recomendo vivamente, mesmo a quem não goste de cinema, e do qual não resisto a transcrever o episódio da visita à estátua da Liberdade, em Manhattan (o livro está recheado deles, sempre inspirados num determinado filme):
... Subi, como toda a gente primeiro de elevador e depois atirei-me desportivamente à subida dos degraus. Calculo que o que se tem de subir a pé seja o correspondente a um quarto andar e, a pouco mais de meio caminho, comecei a ter alguns sinais de fadiga, com o meu coração já a acusar os excessos pelos quais o fiz passar, mas sempre pensando de forma altruísta que a Liberdade é coisa muito difícil de conquistar como a história o tem provado.
Mais do que eu, o arfar de um homem e de uma mulher pró rechonchudo, acompanhados de um filho e de uma filha que, em termos de envergadura, seguiam a inclinação dos pais, metia aflição. Era a muito custo que se arrastavam degrau a degrau, parando de quando em vez.
Às tantas o homem não resistiu. Não, não morreu, mas teve para a mulher um sincero desabafo e, em português genuíno e pátrio, exclamou: «Mas que caralho, nunca mais chegamos aos cornos desta puta!»
Já não existe como sala de cinema. Fecharam-no em Novembro do ano passado quando estava prestes a fazer 32 anos de existência. Enquanto durou, principalmente nos primeiros anos, chegou a ter uma progaramção acima da média. Por vezes ouvia-se a acção do filme que estava a passar na sala ao lado, por vezes a projecção tinha soluços, mas desempenhou um papel importante. Mais uma vítima dos cinemas que se instalaram nas grades superficies.
Quanto ao livro com um excelente título, “Entrefitas e Entretelas”, é minha opinião que Pedro Bandeira Freire acabou por esbanjar uma estupenda ideia. Abrir cada capítulo com o diálogo de um filme é algo que prometia, mas acabou não corresponder à expectativa. Esperava-se algo mais da sua experiência de cinéfilo e empresário independente, do que uma sucessão de episódios anedóticos, as pequenas com quem andou, os copos que bebeu.
O Eduardo Prado Coelho disse um dia que comprava alguns livros pelo prazer de se indignar.
Aconteceu-me o mesmo mas só o constatei depois de ter desembolsado os 17,95 euros. Apesar de que, quando estou bem disposto, ir dizendo que nunca me arrependo de comprar um livro. Mesmo quando me desilude!
O Quarteto já não existe!?!
Como eram deliciosas aquelas sessões duplas à meia-noite!!!
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