quinta-feira, 5 de novembro de 2009

WHAT’S THE DIFFERENCE, SCOTT McKENZIE…?


In 1969 I was following the sun
On my highway of enemies and friends
Just hoping that I might see the grave eastern line
Before the time came for me to meet my end


1969/Scott McKenzie

Em minha opinião pessoal, há umas semanas atrás tratou-se aqui muito mal Scott Mckenzie (SM)…. Insurgi-me logo na altura, embora sem tempo para ir muito mais longe na defesa da “minha dama”. Voltarei hoje à carga, para repor aquilo que considero ser uma injustiça…

Aviso, desde já, que não tenho espírito “missionário” e não desejo converter ninguém. Não tenho, também, qualquer problema em ficar sozinho a agitar as bandeiras de quem gosto.. Ao longo dos tempos, isso sempre me deu, até, um certo gozo.

Entristeceu-me, em boa verdade, que num “blog” em que se passeia tanta gente que sabe mais de música a dormir do que eu acordado, se insista na tecla do “one hit wonder” cada vez que se fala em SM. Não é a afirmação em si que me preocupa, porque a análise objectiva das tabelas dos diversos “hit parade” documenta-o sem margem para grandes dúvidas. O que me preocupa é o tom depreciativo que vem associado a essa expressão, como quem diz: “coitado, fez o San Francisco e nunca conseguiu fazer mais nada”… O que me preocupa é, também, a demasiada importância dada aos “hits” enquanto barómetro de qualidade, que está subjacente a essa expressão. Se na minha colecção eu tivesse de guardar apenas os “hits” à escala planetária, seria obrigado a desfazer-me de 95% dos meus discos…

Gosto muito de SM. Da sua voz, da sensibilidade e emoção que imprime a muitas das suas interpretações. Para além de “San Francisco”, tenho a profunda convicção de que SM compôs e/ou interpretou excelentes canções. “Like an Old Time Movie”, também escrita por John Phillips é magnífica, e para mim mesmo superior a “San Francisco”. “What’s the Difference”, composta pelo próprio Scott, é belíssima (refiro-me ao Chapter II, que prefiro ao Chapter I…). Gosto muito do primeiro LP de Scott, “The Voice of Scott McKenzie” (1967), no qual interpreta também músicas de Tim Hardin, Donovan e John Sebastian.

Se rebobinarmos um bocadinho o filme até ao início dos anos 60, vamos encontrar SM (que na realidade se chamava Philip Blondheim…), já ao lado de John Phillips, num grupo que se chamava “The Smoothies”, cuja única gravação que conheço (“Ride, Ride, Ride”) é a que consta da colectânea “Stained Glass Reflections 1960 – 1970) que aqui vos apresento. Mas um ano depois ele já integrava os “The Journeymen”, sempre ao lado de Phillips e, agora, de Dick Weissman, um dos maiores “guitar and banjo players” desses tempos.

“The Journeymen”, cuja obra (3 LP’s) está inteiramente disponível em CD, foram um dos mais interessantes grupos “Pop Folk” que surgiram nos EUA no início dos anos 60, em busca do El Dorado que o mega-sucesso dos Kingston Trio tinha deixado antever. A selecção musical, os arranjos e as harmonias vocais tão do gosto de John Phillips são excelentes, e é bem patente a contribuição de SM para que esse nível de qualidade tivesse sido atingido. Chamo, também, a atenção para a extrema beleza das canções onde Scott é “lead singer”, como é o caso, para vos dar só um exemplo, de “500 Miles”, um original da Eddy West.

Mas se eram assim tão bons, porque é que os “Journeymen” acabaram, perguntar-me-ão vocês… Porque os malvados quatro cabeleiras do Apocalipse rebentaram com tudo o que estava à sua volta e, em particular, com a Folk Music daqueles tempos , responder-vos-ei eu…

Retomando de novo o filme onde o deixei, lembro que Scott McKenzie reagiu muito mal ao sucesso de “San Francisco” e, em especial, ao fortíssimo impacto social que essa música teve. Nunca se conformou com o facto de dezenas de milhares de hippies terem debandado SF, em condições de qualidade de vida deploráveis e à procura não se sabe bem de quê, só por terem sentido um apelo na sua canção. Referia-se a esse movimento, em tom depreciativo, por “that flower power nonsense”… Zangou-se a sério com John Phillips por este o ter metido nessa alhada e por desejar continuar a empurrá-lo cada vez mais para baixo, desde que isso lhe fizesse aumentar a conta bancária. Esteve 16 anos sem lhe falar…

Por esta altura (1967/68), SM esteve muito próximo da depressão. É que, quanto mais se procurava afastar dessa imagem de hippie e dessa música, mais as multidões o puxavam para lá. E Scott não foi feito para ser uma “superstar”…

Na já aqui referida “What’s the Difference”, Scott escreveu algo que me parece premonitório do que lhe iria suceder no resto da vida:

Hey what’s the difference if we don’t come back?
Who’s gonna miss us in a year or so?
Nobody knows us for the things we’ve been thinking
So what’s the difference if we go?

E Scott partiu. Refugiou-se numa cabana no deserto durante quase dois anos e regressou de lá com um punhado de belas canções que iriam dar origem ao seu segundo LP, “Stained Glass Morning” (1970), a que ninguém deu grande importância, com a provável excepção de Johnny Rivers, que escolheu “1969” para o seu álbum de que eu mais gosto, “Slim Slo Slider”, mudando-lhe o nome para “Enemies and Friends”.

“Stained Glass Morning” não é nenhuma pérola escondida da Música Popular. Mas é um álbum profundamente honesto, de qualidade claramente acima da média, que não merecia ter sido recebido com o desprezo com que o foi. Scott afastou-se das tonalidades “Pop” desses tempos e refugiou-se num registo aqui e além mais próximo das suas origens de “folk singer”. As letras são carregadas de significado (“Dear Sister”, por exemplo, é um belíssimo libelo anti-Vietnam), os arranjos discretos, mas eficazes, e Scott teve a acompanhá-lo em estúdio músicos de grande qualidade, como é o caso de Ry Cooder, Rusty Young e Barry McGuire. E poucos se podem orgulhar de terem sido plagiados por Leonard Cohen (é claro que estou a brincar, mas “Crazy Man” tem partes que se assemelham perigosamente de “Everybody Knows”, que Cohen escreveu mais de vinte anos depois…)…

Scott McKenzie percebeu então, de uma vez para todas, que, fizesse ele de bom o que fizesse, tinha um letreiro na testa que o iria marcar para sempre. Desiludido, refugiou-se em Virgínia Beach e afastou-se da música durante mais de 10 anos. Voltaria só em meados dos anos 80, integrado numa nova formação dos “Mamas & Papas”, que incluía o original Denny Doherty, Spanky McFarlane e McKenzie Phillips, filha de John e a quem Scott tinha roubado o nome vinte e cinco anos antes…

Tive muita pena de não ter podido ir vê-lo ao Casino do Estoril nessa altura, e não o censuro por ter querido divertir-se e ganhar uns cobres, embarcando nessa aventura a que toda gente torceu o nariz. Foi um percursor….. Não é isso que os “velhotes” todos estão a fazer, nos dias de hoje…?

Se um dia houver uma onda revivalista séria dos Mamas & Papas, como a houve com os Beach Boys e os manos Wilson, talvez que o “tontinho de San Francisco” possa vir a ser “reabilitado”, como bem o merece. Caso contrário, e se nem sequer os seus contemporâneos conhecedores da Música lhe ligam patavina….

What’s the difference, Scott McKenzie…?

Colaboração de Luís Mira

13 comentários:

Camilo disse...

hops!...

Edward Soja disse...

Muito bem, amigo Luís.

O teu belo texto em defesa da honra fica guardado e retém em mim o nome do Scott.

De certeza absoluta que terá boas canções, e eu quero conhecê-las.

O folk americano teve tantas pérolas, não pode uma canção, como tem feito, obnubilar-nos das restantes, onde há, certamente, e acredito em ti, muita luz.

Obrigado pelo texto.
:)

Rato disse...

Não conheço de todo os albuns do Scott, mas mais uma vez um texto do Luis Mira despertou em mim tal curiosidade. O problema é que se calhar não vou encontrar nada por essa net fora. Mas vou tentar...

Rato disse...

Por falar em raridades, este fim-de-semana vai haver Mary Travers no blog do Rato. Mais uma cortesia do Mira e Gin Tonic. Estejam atentos portanto.

ié-ié disse...

Se estiveres interessado, posso mandar-te ficheiros deste álbum.

LT

Luis MIra disse...

Bom dia Rato!

Se os não conhece, também não perde nada em tentar.
O vinil de "The Voice of Scott McKenzie", bem como os 3 CD's dos "The Journeymen", estão à sua disposição, já que o "Ié-Ié" já lhe resolveu o problema desta colectânea.

Quanto à Mary Travers, eu próprio também serei um cliente interessado, já que não os tenho em CD. Só lhe enviei esses três porque os restantes dois foram comprados em segunda mão e não têm o mesmo estado de conservação, o que inviabiliza a sua publicação. Mas trambém poderão seguir mesmo assim, se lhe interessar...

Um abraço do LM

DANIEL BACELAR disse...

Oh Pessoal!!!!!
Mas não vamos ter amanhã dia 7 mais um dos nossos almocinhos exactamente para falarmos destas coisas que afinal de contas é "O NOSSO MUNDO" (felizmente!!)
AH!!!!Já percebi,como vai ficar tudo agarrado ás "francesinhas" e com a bôca cheia,se calhar têm medo de não terem tempo...!!!!

gin-tonic disse...

Errado, carissimo Danuel Bacelar.
Os almoços são para troca de discos, livros, revistas, DVds ...alguma má-língua...e... definitivamente marcar o teu concero no "Maxime"... Ou pensas que vais passar outro século sem cantar a Marcianita?...
Os almoços não são o sítio ideal par discutir Scott Mckenzie, o que quer que seja. É aqui que a discussão deve ser feita, mas muita rapaziada está a fugir com o cu à seringa...
Por ele vai tratar, rapidamente de atenuar a sua imensa ignorância e ouvir o que lhe falta do conhecer do Scott que, tirando três, quaro canções é...TUDO!...

ié-ié disse...

Pois eu estive a rever a carreira de Scott enquanto tomava banho (uma das coisas boas do blogue é que nos leva a re-ouvir coisas esquecidas) e apesar da bondade do texto do Miguel (ah! ah! ah!) ainda acho que "San Francisco" ainda é a melhor coisa.

E também considero que ele (Scott) não tem nada que desesperar. Se fosse a ele tinha mesmo orgulho (fez 70 anos este ano).

LT

Rato disse...

Encontrei uma compilação na Amazon que em princípio mandarei vir e que me parece ser esta mesma mas com outra capa, já que também vem lá referido este album, "Stained Glass Morning" como completo

UILTON SOARES DE MELLO disse...

Caramba, a foto não é do Scott McKenzie....rsrsrs.... É do Johnny Rivers....

ié-ié disse...

Será? Tenho dúvidas...

LT

Edward Soja disse...

Pois... Agora que foi levantada a questão, também me parece que não. O Scott tem uma boquinha mais pequena... E teria tido aquela barbicha?