segunda-feira, 22 de junho de 2009

O MAIOR COMÍCIO ANTES DO 25 DE ABRIL


No dia 22 de Junho de 1969, faz hoje exactamente 40 anos, realizou-se no Estádio Nacional, em Lisboa, a final da Taça de Portugal, em futebol, entre as equipas da Académica e do Benfica.

A final ocorreu no rescaldo do Maio-68 português, cujo epicentro foi a Universidade de Coimbra.

O estudantes não quiseram deixar passar em claro a excelente oportunidade que tinham pela frente e clandestinamente organizaram o maior comício num campo de futebol antes de Abril.

O presidente da Associação Académica de Coimbra, Alberto Martins, actual líder parlamentar do PS, mobilizava:

Fiz-me comentador desportivo para fugir à censura, passar a mensagem, a senha: a moral dos estudantes de Coimbra é muito elevada e acreditamos na vitória.
A maior greve da história dos estudantes portugueses contra a ditadura, em Coimbra, a 17 de Abril, desceu a Lisboa e ajudou a encher o Estádio.

Na véspera do jogo, o "Diário de Lisboa" publicou uma pequena mas habilidosa entrevista com Alberto Martins:

A Académica, animada pelos últimos e brilhantes triunfos, apesar das grandes dificuldades, encara com toda a confiança o resultado final.

O moral dos estudantes é extremamente elevado. E apesar das dificuldades que rodeiam esta partida decisiva, os estudantes de Coimbra encaram-na com a sua já habitual serenidade e com a maturidade que os caracteriza.

É sempre impossível prever o desfecho de uma contenda deste género, em que o adversário certamente nos saberá opôr todas as suas valiosas armas.

O espírito de equipa, o colectivismo e o entusiasmo dos estudantes terão uma vez mais de enfrentar um adversário poderoso.

Mas endurecidos por todas as pelejas e vitórias anteriores, estamos em condições de discutir o resultado, embora o opositor seja uma equipa da categoria do Benfica.

Que o resultado seja o prémio para a melhor equipa em campo e corresponda à justiça do jogo.

Pela primeira vez, o Chefe de Estado, almirante Américo Tomás, receoso das manifestações estudantis, escusou-se a estar presente no Jamor, delegando no director-geral dos Desportos, Armando Rocha, o que não deixou de ser notado.

Se bem me lembro, também a RTP se esquivou à transmissão directa do jogo, quebrando mais um hábito.

Notados foram igualmente os cartazes e as faixas de teor político que os estudantes ostensivamente ergueram nas bancadas.

Escreveu o "Diário Popular" a seguir ao jogo:

Ao principiar o jogo, a claque dos estudantes, dividida pelas duas cabeceiras, começou a cantar o hino nacional e, juntamente com grandes bandeiras da Académica, todas elas com o sinal de luto, exibiu vários cartazes com legendas deste estilo: "A Académica está de luto", "Universidade livre", "Viva a liberdade!".

Não se registaram, entretanto, quaisquer incidentes.

Durante o intervalo voltaram a aparecer cartazes do mesmo género e gritos no teor dos cartazes.

A Polícia mantinha-se na expectativa, a olhar, mas sem intervir.

Nas duas cabeceiras começaram entretanto a aparecer alguns indivíduos isolados a discursar, falando da liberdade e de mais ensino e menos polícia...

Alguns assistentes batiam palmas, mas a Polícia continuava a não intervir.

A certa altura, porém, foram detidos, discretamente, dois dos improvisados oradores, que não puseram objecção.

Heróis do jogo: Viegas, Gervásio, Vieira Nunes, Belo, Marques, Rui Rodrigues, Nene, Mário Campos, Manuel António, Peres (Serafim) e Vítor Campos (Rocha).

13 comentários:

Jack Kerouac disse...

Heróis do jogo ????? então como ficou o resultado final ? Heróis na bancada sim senhor, dentro do campo a história era outra.

Rato disse...

Tens toda a razão, Paulo. O então ainda Glorioso ganhou por 2 a 1 e levou a taça!

JC disse...

Fui ver o jogo, claro, e lembro-me de todos esses acontecimentos, já c/ cheiro a fim de regime, que vivi c/ entusiasmo.Grande equipa tinha a Académica quando ainda não era filial do FCP, embora naquele jeito de futebol sem balizas,à custa da lei da opção e da lei escolar que limitavam a liberdade contratual, o que não deixa de ter o seu quê de irónico neste contexto.
já agora, penso esse tal Nene,um género de nº10, tido como grande esperança, morreu num desastre de automóvel não mtº tempo depois. Confirmas. LT?

gin-tonic disse...

Esteve lá atrás da baliza do topo norte. Lembra os panos a passrem de mão em mão, ao longo das bancadas, lembra os jogadores da Académica a entrarem em campo com capa e batina depois de os terem proibido de equiparem de branco.
Foi a única vez que quiz que o seu clube perdesse um jogo. A outra taça que ali se jogava, bem mais importante, era de um outro campeonato, que só viria a ser ganho em Abril de 1974.
Dos cinco amigos com que foi nessa tarde ao Jamor, dois já não andam por aqui mas ainda viram a cor da liberdade. Também lembra o bacalhau assado que foram comer ao Zé Duarte, um tasco no Alto de Santo Amaro.
Era Ministro da Educação José Hermano Saraiva que ainda anda por aí a contar outras histórias...
Como acredito que o actual lider paralamentar da bancada do Partido Socialista olhe com espanto para esse outro Alberto Martins de há 40anos...

ié-ié disse...

Não há nada a fazer! Está-lhe no âmago, meteu pelas veias e de lá já não sai. Um verdadeiro dogma! Meteu-se na cabeça do nosso JC que a Briosa é uma "filial do PCP" (sorry, do FCP) e ele acredita mesmo nisso! Não faz mal.

Intencionalmente fiz um "post político", mas o futebol-benfiquista tinha de vir à tona. Com excepção, glória ao Gin-Tonic.

Numa coisa estou de acordo com JC e já aqui o expressei mais do que uma vez: no Estado Novo, a Briosa era beneficiada pela chamada lei escolar. A Académica ganhava, digamos jogadores profissionais, (Serafim e Peres são por acaso exemplos desta final), mas os jogadores também ficavam, pelo menos, a saber ler e escrever (estou a exagerar, é claro).

E sim, Nene, morreu pouco depois num desastre de automóvel na Figueira, se não me engano. Acho que também já falámos disso por aqui.

Nene pode ter sido a primeira vítima do que são as transferências loucas de jogadores da bola.

O Sporting deu mundos e fundos pelo jogador incluindo um bólide (da altura) e foi nele que Nene morreu.

"Não levámos a Taça, mas ganhámos o jogo".

LT

JC disse...

Escrevi umas coisas s/ assunto (sem SLB e c/ pouco futebol) lá pelo meu "blog".
Mas são filiais, e "prontos"!!!
Abraço

Camilo disse...

Claro que a maior tragédia foi a "Briosa" ter perdido!!!
Nessa final, EU ERA da ACADÉMICA desde pequenino!!!

Camilo disse...

Quero rir...
O Benfas ganhou porque o árbitro era da... P.I.D.E.!!!

JC disse...

Não sabia que o Camilo tinha sido árbitro! Ele há cada surpresa!

Camilo disse...

Estava longe,
muito loooooooonge!!!

Jack Kerouac disse...

O Senhor Titá tem é uma grande lata, chama-se a isso atirar a pedra e esconder a mão. Se o post era político, e bem, para quÊ a referência inútil aos heróis do jogo, que não o foram nem eram para aqui chamados ? :) heróis de quÊ e porquê ?

Camilo disse...

Os "heróis" foram o... Benfica, sempre defendido -e bem- pelo regime.
Não haja qualquer dúvida sobre isso!!!

Anónimo disse...

A Académica de Coimbra assinala hoje a passagem de 70 anos sobre a conquista da primeira edição da Taça de Portugal, que subsiste como feito desportivo mais importante da história do clube. "