quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

DO FASCÍNIO À SEDUÇÃO


Estes pequenos livros da D. Quixote, sobre temas do momento, foram muito populares no final dos anos 60 e início dos 70. Este é o nº 32, editado em 1971.

Um pouco enviesados á esquerda - reconhecemos hoje - mas, por isso mesmo, bem de acordo com o "ar do tempo".

Quem, para além dos indefectíveis do regime, não se reclamava então da esquerda? A quem, de uma maneira ou de outra, nessa altura, os ideais do socialismo não tocaram?

Esse é, aliás, um dos erros do "José", um dos comentadores habituais do Ié-Ié, que me parece querer sempre julgar a História à luz do que são hoje o pensamento e a cultura dominantes.

E Cuba, tal como também a China ou a Albânia, eram um refúgio para os que tinham deixado de crer na URSS de Stalin, ou na da Hungria de 1956 ou mais tarde na de Praga.

Mais ainda, pela aura romântica da sua revolução, pelas aventuras Guevaristas que lhe davam um cunho, de certo modo, mais individualista, mais libertário, isto é, mais ao gosto de quem se tinha habituado a fruir das liberdades e do individualismo das sociedades ocidentais que nos tinham dado o "rock and roll", o Maio de 68 e o movimento hippie, Cuba era a revolução por excelência da jovem burguesia urbana e intelectual fautora e herdeira de tudo isso.

Nunca esse fascínio foi tão evidente nos meios operários, por exemplo. E do fascínio à sedução vai um pequeno passo que tende a toldar a realidade, não é assim?

Bom, voltando aos livros da D. Quixote (na biblioteca que era a do meu pai existem umas duas dezenas de volumes).

Quando consultamos a lista dos já editados, presente em cada volume, verificamos que muitos se encontravam já "fora do mercado", o que, no léxico de então, significava que tinham sido proibidos e, por isso, a sua compra era inacessível a quem não fosse da confiança do Sr. Barata, proprietário da pequena livraria/papelaria homónima situada na Av. de Roma e que lá retirava das catacumbas um exemplar escondido.

Daí o apelo, em cada livro, à assinatura da colecção, método expedito de receber o livro antes de ter sido proibido. Assim deve ter feito o meu pai, claro. Era assim a vida no Portugal da ditadura. Seria um pouco assim a vida em todas as ditaduras. Alguém tem saudades?

Colaboração de JC

2 comentários:

Anónimo disse...

Parece que sim...

Camilo disse...

Em Luanda, em casa da minha sogra, na Rua Cabral Moncada (mesmo juntinho à casa do "cantor" Rui Mingas...) um Amigo Cubano, chefe da Inteligência (!)... numa noite de "amistad", confidenciou-me:
"-Camilo, quando Fidel morrer, nem Raúl, nem ninguém conseguirá aguentar o povo Cubano!"
"-Porquê? O que é que pensas que o povo irá fazer?"
"-Tu depois verás!!!"
"-Estás com medo que isso aconteça?- perguntei, devido ao posto que tinha"
"-Sim, pois o povo, nessa altura,vai ficar cego de raiva!".
Claro que esta conversa foi em espanhol. Tempos depois, este chefe Cubano esteve (sigiloso)no meu casamento e, juntamente comigo e com a minha mulher, deixou-se fotografar..."para la posteridad" - disse ele.
Logo que o carniceiro cubano seja enterrado, publicarei estas fotos AQUI NO "IÉ-IÉ"!!!