terça-feira, 27 de janeiro de 2009

JOVEM GUARDA À PORTUGUESA


Nos anos 60, Portugal vivia uma feroz ditadura de direita. O país encontrava-se fechado sobre si mesmo, no que Salazar apelidava de “orgulhosamente sós”.

Não havia eleições, nem liberdades. A censura amordaçava a expressão das ideias, a juventude não tinha outro futuro que não fosse a guerra colonial em três frente de combate: Angola, Moçambique e Guiné.

A guitarra era substituída pela metralhadora.

Por razões históricas e de proximidade, cabia então à França o papel de “colonizador cultural” de Portugal. No cinema, com nomes como Godard, Truffaut, Vadim, Lelouch e outros. Na literatura, com Camus, Sartre. Na música popular Johnny Hallyday, Sylvie Vartan, Françoise Hardy.

Mesmo quando na Grã-Bretanha, os Beatles encabeçam a Revolução Cultural e Social, Portugal – por maioria de razão – resiste à investida, mantendo-se maioritariamente fiel às ondas gaulesas.

Apesar da língua comum e das origens históricas uníssonas, também o Brasil e a sua Jovem Guarda mantiveram a distância de Lisboa, só comparável à imensidão do oceano que separa os dois países.

Como seria de esperar, Roberto Carlos foi a grande excepção e, talvez, Celly Campello, únicos nomes brasileiros verdadeiramente ilustres no cinzentismo da música popular portuguesa dos anos 60.

Zeca do Rock, um dos proeminentes músicos portugueses da altura, autor do primeiro “yé-yé” cantado em Portugal, e, actualmente, a viver no Brasil, conta à Jovem Guarda como foi em Portugal:

Primeiro foi a Celly Campello e seu irmão Tony. A Celly era a Brenda Lee brasileira. Mas nenhum dos dois foi alguma vez aceite por aqueles que depois se vieram a considerar a Jovem Guarda. Deles todos (e são muitos) só o Roberto Carlos conquistou o Atlântico.

Muito pouca coisa da Wanderlea apareceu entre nós, porque acho que nada foi publicado oficialmente. Dos restantes, nem sombra.

E é fácil compreender porquê. Nós tínhamos todas as versões originais anglo-americanas, mais as versões francesas, mais as versões italianas. Quem se iria interessar por versões brasileiras que, geralmente, tinham letras de pôr os cabelos em pé a um careca?

O Roberto cantou desde o início muito material original dele com o Erasmo, por isso o público português perdoou-lhe barbaridades como o “Splish-Splash”, entre outras.

A Jovem Guarda brasileira não teve qualquer influência em Portugal em época nenhuma,
conclui, com algum azedume, Zeca do Rock.

Visão diferente tem Daniel Bacelar, considerado o “Ricky Nelson português”, autor de êxitos como "Marcianita", “Olhando Para O Céu”, “Fui Louco Por Ti” e “Miudita”.

Também em declarações à Jovem Guarda , Daniel Bacelar admite uma maior influência da Jovem Guarda:

Na realidade, Celly Campello (“Lenda da Conchinha”) e o irmão, Tony, fizeram imenso sucesso, especialmente ela, mas houve muitos outros como Sérgio Murillo (“Marcianita”), Osmar Navarro (“Quem É?”), Roberto Carlos, claro, e o fantástico Erasmo Carlos que, para mim, continua a ser superior ao Robertinho, Demétrius (“Ritmo da Chuva”), Ronnie Cord (“Biquini Amarelo”), Carlos Gonzaga (“Diana”).

“Os brasileiros –
diz ainda Daniel Bacelar – sempre foram muito bons a copiar e as versões em português (do Brasil, claro está) de grandes sucessos norte-americanos ficavam sempre muito semelhantes ao original, o que nos fazia na altura uma certa inveja, pois os conjuntos que havia, apesar de terem muito bons músicos, estavam mais inclinados para a música de baile e italiana, faltando-lhes aquele “feeling” que os “malandros” dos brasileiros copiavam tão bem.

“Na realidade, houve uma grande influência da Jovem Guarda na jovem música portuguesa, bem como da música brasileira em geral”,
finalizou.

João Carlos, que sob o pseudónimo de Rato mantém na net um dos mais interessantes blogues sobre a música dos anos 60 - Rato Records – possui uma visão peculiar sobre a influência da Jovem Guarda na música portuguesa, já que, à altura, vivia em Moçambique.

Só posso referir o que vivi na altura em Moçambique, onde penso que havia mais abertura do que em Portugal (ou Metrópole, como então se dizia) no que diz respeito ás coisas da Cultura (e não só).

Nós tínhamos uma grande influência da vizinha África do Sul, onde nos deslocávamos muitas vezes para nos abastecermos com as últimas novidades musicais.

Até 67/68 a música que consumíamos era “servida” quase sempre em formato reduzido (singles e EPs), com uma predominância muito grande de intérpretes anglo-americanos (e também muitos grupos sul-africanos).

Não devo andar muito longe da verdade se disser que apenas 25 % englobava outras nacionalidades, nomeadamente a francesa, a italiana e, claro, a brasileira.

No princípio dos anos 60 era essencialmente a Celly Campello e, mais tarde, sobretudo entre 1964 e 1966, mais alguns (poucos) nomes, onde se destacava Roberto Carlos (com a parte de leão), e também Erasmo e Ronnie Von.

Depois, com o terminar da década e a morte do single, cada vez mais preterido em relação ao álbum (muito por culpa de “Sgt. Pepper’s”, editado em Junho de 1967), a grande influência brasileira deixou de ser a Jovem Guarda (que estava agonizante) para passar a ser a onda tropicalista (com Gal e Caetano á cabeça). Uma referência ainda a Chico Buarque que, não sendo nem uma coisa nem outra, sempre foi um referência fundamental desde que “A Banda” apareceu em 1966”,
concluiu João Carlos.

Carlos Santos, também ele singular apreciador da música dos anos 60, opina que, realmente, a Jovem Guarda teve o expoente máximo, em Portugal, em Roberto Carlos, adiantando que ainda hoje o cantor brasileiro é muito ouvido.

Mas não podemos esquecer outros grupos e artistas que na altura tiveram êxito e também foram muito queridos no nosso país e fizeram as delícias de muita “malta”, apesar de não terem tido tanta influência. Estou a lembrar-me, por exemplo, de Erasmo Carlos, Golden Boys, Celly Campello e seu irmão, Tony, Incríveis, Fevers, Renato e Blue Caps.

Mas ainda outros tiveram alguns êxitos por cá: Silvinha, Martinha, Wanderlea, Trio Esperança, Jet Blacks, Jordans, Leno e Lilian, Ronnie Von, Jerry Adriani, Brazilian Bitles. Menos conhecidos, mas de que eu também gostava apareceram os Brazões, Galaxies, Luizinho e seus Dinamites, VIPs...

Cortesia de Jovem Guarda

3 comentários:

Anónimo disse...

Interessante retrato (de uma parte)dos anos 60

Pelo que poderia ser oportuno colocar a etiqueta ANOS 60

Fantomas disse...

Muitos discos de cantores e grupos da jovem guarda, foram cá editados pela cbs.

Anónimo disse...

Ronnie Von ainda hoje está na ribalta como apresentador de uma cadeia de televisão de São Paulo, mantendo o seu ar de galã, como o filhote não me deixará mentir.

(S)LB