domingo, 8 de novembro de 2009

FOR MARY, WHENEVER I MAY FIND HER….


(imagem confiscada no Google)

Em boa verdade, Peter, Paul and Mary nunca foram um trio mas, simplesmente, um duo constituído por Mary Travers e por Peter Yarrow…

Sim, eu sei que também andava por lá um tal de Noel Stookey, simpático e bonacheirão como o próprio “Santa Claus”, embora bastante mais alto e magrinho. Mas esse rapaz nunca acrescentou grande coisa à causa, salvo entreter o pagode nos espectáculos “ao vivo”, durante intermináveis minutos, enquanto Peter e Mary faziam descansar a sua voz…

Enorme injustiça e exagero da minha parte…?

Pois bem, faça-se uma experiência: pegue-se no primeiro disco de P.P.&M (chamado mesmo assim, “Peter Paul and Mary” – 1962) e ouçam-se as suas três primeiras canções… Compare-se a enorme confusão interpretativa de “Early in the Morning”, em que Paul é “lead vocal”, com a singeleza de “500 Miles” e “Sorrow”, basicamente interpretados por Mary e Peter, respectivamente..

É apenas um exemplo dos muitos que encontramos ao longo de todo o repertório dos P.P.&M.

Mas a quem não estiver convencido e me vier dizer que a escolha dos arranjos vocais é responsabilidade de Milton Okun e que Albert Grossman também aí terá metido a sua colherada, lanço um outro desafio: peguem nas primeiras obras a solo de cada um deles e comparem…

Aqui não há desculpas de “contaminização” e cada qual voou com as suas próprias asas.

Resultado? Mary Travers e Peter Yarrow deixaram para a posteridade dois discos essenciais da “Música Popular” dos anos 70, e Noel Stockey um disco fraquinho, embora, ainda assim, seja o seu melhor…

Duo ou trio, consoante a apetência de cada um, para mim uma coisa é certa: Deus sabe como eu gosto de Peter Yarrow, mas quantas vezes desejei que todas aquelas vozes masculinas se calassem, e PP&M fossem uma só voz: a pura e cristalina voz de Mary Travers…!

Quantas vezes desejei que nenhuma outra voz me viesse perturbar aquele equilíbrio, aquela tranquilidade e aquela enorme paz interior que me era proporcionada pela voz de Mary Travers…!

Mas lá haveríamos de chegar com o seu primeiro álbum a solo, e ainda hoje me lembro do encantamento que foi a descoberta daquele disquinho amarelo com letras cor-de-rosa. E nunca os poemas de John Denver, Ewan MacColl e tantos outros me soaram tão bem…

Recuo no tempo e tenho diante de mim uma foto de Mary Travers datada com imprecisão, mas cuja legenda refere “circa de 1954/55", ainda eu andava de gatas. Foi tirada no Washington Square de Greenwich Village, no próprio bairro onde vivia desde os dois anos de idade. Como sempre, canta com o olhar determinado e, aposto, voz firme, cabelo apanhado para trás com imperceptíveis ganchinhos. Felizmente que ela já andaria, nessa altura, pelos seus 18/19 anos, senão seria obrigado a dizer que essa fotografia faz acordar o “pedófilo musical” que existe dentro de cada um de nós: passar-lhe a mão pelo cabelo, deitar a minha cabeça no seu regaço e ouvi-la cantar só para mim…

Mary começou a cantar mais a sério aos catorze anos, com os Song Swappers, um coro infantil que chegou a gravar alguns discos para a Folkways Records, com o apoio de Peter Seeger e de Erik Darling. Mas reconhecer a sua voz nas gravações que subsistem desses tempos não é coisa fácil, uma vez que a miudagem canta em coro.. Mas, do que conheço, há uma possível excepção com “Putting on Style”, que tem partes a solo com Mary Travers. Que a partir daí nunca mais parou de cantar, quase até morrer…

E que impressão me fazia ver Mary Travers, nestes últimos anos. E que admiração me suscitava, ao mesmo tempo… As sucessivas doenças e intervenções cirúrgicas fizeram da delgadinha Mary uma mulher forte e inchada. Pior do que isso, a sua voz foi claramente afectada…

Mas a dignidade da da sua presença, essa manteve-se intacta. Talvez tivéssemos gostado de ver Mary Travers envelhecer como Judy Collins, três anos mais nova, que tive a felicidade de rever este ano em Vila Nova de Famalicão. A mesmo delicadeza do passado, o mesmo rosto magro, o mesmo longo cabelo apanhado atrás, a mesma qualidade de voz, tudo isto do alto dos seus 70 anos. Mas é de louvar a forma como Mary prosseguiu até ao fim, quando poderia muito bem ter abandonado tudo.

Ao contrário do que, em geral, me sucede, não tenho qualquer dificuldade em escolher a interpretação de Mary Travers de que mais gosto. Faz parte de “Peter, Paul and Mary Álbum” (1966), chama-se “For Baby (For Bobbie)” e foi composta por um senhor que se chamava Henry John Deutschendorf Jr, que não é mais do que o nosso querido John Denver.

Reza assim:

I’ll Walk in the rain, by your side
I’ll cling to the warmth of your tiny hand
I’ll do anything to help you understand
I love you more than anybody can
And the wind will whisper your name to me
Little birds will sing along in time
The leaves will bow down when you walk by
And morning bells will chime
I’ll be there when you’re feeling down
To kiss away the tears if you cry
And I’ll share with you all the happiness I’ve found
A reflection of the love in your eyes
And I’ll sing you the songs of the rainbow
Whisper all the joy that is mine
The leaves will bow down when you walk by
And morning bells will chime

Um monumento ao “Kitsh”, dir-me-ão alguns. Talvez… Mas para mim, na voz de Mary Travers, é música celestial. E repare-se que não é por acaso que esta música se encontra gravada mais baixo do que o resto álbum. Ela é um sussurro, um murmúrio feito para se ouvir suavemente ao nosso ouvido…

E é esta a Mary Travers que trago dentro de mim e que jamais deixarei morrer. Se o Bom Deus tivesse a bondade de me conceder um aviso prévio de uma horita antes de me chamar ao seu encontro, de maneira a ainda ter tempo para ouvir umas últimas musiquinhas, esta não iria faltar, seguramente…..

Não falo da Mary Travers das batalhas pelos Direitos Humanos e da luta pelas boas causas políticas…? Pois não. Respeito-a, mas não gosto mais dela por causa disso. E outros o fizeram, tão bem ou melhor do que ela…

Mary Travers interpretou muitas canções de outros autores mas, ao invés de Peter Yarrow, não compôs muita coisa. Talvez que o seu mais bonito poema seja “Erika”, que declama no seu primeiro álbum e dedicou à sua filha mais velha há perto de quarenta anos atrás. E é a ele que vou roubar as palavras com que me despeço:

All my hope and love for you
My Mary, with the windy yellow hair”
Rest in peace, Mary Allin…
Your beloved friend,

Luis Mira

Nota do editor: no blogue do Rato encontram os álbuns de Mary Travers.

3 comentários:

JC disse...

Belo título do "post", LM, adaptado de um dos mais belos temas de Simon & Garfunkel.
Continuo a gostar mtº de Mary e de PPM, mas talvez já sem a mesma enorme devoção dos meus "salad days",à qual a beleza angelical de Mary tb não seria alheia. Pq será? Tal como me penalizo por não ser devoto de Mahler, acho o defeito deve ser meu.

Teresa disse...

Estava no Skype a falar com um amigo. E falava-lhe de Mary Travers, de quem lhe mandei ontem algumas músicas. Ao mesmo tempo, ia lendo as coisas em atraso no Google Reader. E encontro isto.

Obrigada, Luís.

P.S. Erika foi uma dass músicas que lhe mandei.

Luis MIra disse...

É claro que sim, JC! Gosto de fazer brincadeiras dessas quando se proporciona...

Quanto à Teresa, não há nada a agradecer. O texto era antigo e na altura tinha pedido ao Gin-Tonic para não o divulgar, porque achei que era muito pessoal e não tinha interesse. Mas o facto do Rato ter divulgado os discos no blogue dele abriu uma nova oportunidade, que o atento Gin não deixou escapar...