domingo, 27 de dezembro de 2009

LUGARES DE VERTIGO 01


Eu já tinha percebido que, cada vez que penso ter uma grande “pancada” por qualquer coisa (um livro, um filme, uma música, ….), aparece sempre alguém que tem exactamente a mesma “pancada” que eu tenho, mas elevada à décima potência. E isso aconteceu-me de novo agora, com a história que vos vou contar.

“Vertigo”, que Alfred Hitchcock realizou em 1958, é um dos filmes da minha vida, daqueles que levaria, sem pestanejar, para a tal ilha deserta. Razões há muitas, objectivas e subjectivas, mas não é isso que me trás hoje aqui…

Acontece que, neste meu regresso a San Francisco, tinha decidido fazer uma peregrinação mais ou menos exemplar aos lugares onde “Vertigo” foi filmado. Não me perguntem porquê. Apeteceu-me… Podia ter-me dado para outra coisa, mas deu-me para isso…!

Ainda em Lisboa, revi pela enésima vez o filme com muito cuidado, tomei as anotações que me pareceram necessárias e, ao chegar a Frisco, meti mãos à obra…

Quanto já estava no “Palace of the Legion of Honor”, um dos lugares de “Vertigo”, reparei que estava anunciado um ciclo de Cinema exclusivamente com filmes rodados em SF, e vi que esse ciclo se iniciava, precisamente, com o “Vertigo”. Reparei, também, que a sessão de abertura incluía uma palestra de Jef Kraft, um dos autores do livro “Footspeps in the Fog – Alfred Hitchcocks’s San Francisco”. A milésima obra sobre Hitchcock, disse cá para mim, e segui caminho porque, já que tinha vindo ao museu, aproveitaria para ver uma exposição sobre “Women Impressionists” que me pareceu interessante, e era mesmo.

No final segui o meu velho hábito de passar pela livraria do museu comprar um catálogo da exposição e reparei numa enorme pilha de livros que lá estavam, que não eram mais do que o tal “Footsteps in the Fog” sobre o Hitchcok de que vos falei. Folheei-o, por curiosidade, e nem queria acreditar no que os meus olhos viam. O que os malucos dos dois autores (Aaron Leventhal é o co-autor) faziam no seu livro não era mais do que aquilo que eu me preparava para fazer com o “Vertigo”! Eles estavam-se nas tintas para os aspectos éticos, estéticos e técnicos da obra de Hitchcock, e a única coisa que lhes interessava eram os aspectos, digamos, paisagísticos. Propunham-se inventariar todas as cenas de exteriores que aparecem nos filmes do autor de “Os Pássaros” que tivessem sido filmadas na Califórnia, mesmo que o enredo situasse a acção noutro local ou noutro país, como era o caso de “Rebeca”, de que já aqui vos falei. E o objectivo do livro era colocar, a par, um fotograma do filme com uma fotografia do local onde a cena tivesse sido filmada, tal como está nos dias de hoje. Levaram esse propósito até às últimas consequências: se as cenas se passassem em telhados, eles iam à procura dos telhados…; tratando-se de uma cena de interiores, mas com uma determinada vista que se apercebia ao fundo, de uma janela, eles iam à procura dessa vista…; e por aí fora…

É claro que comprei logo o livro e é também óbvio que ele me foi de grande utilidade na minha pesquisa, fazendo-me ganhar tempo e dando-me certezas absolutas em aspectos onde, até então, só tinha dúvidas.

A brincadeira que agora vos proponho é essa: passar aqui as minhas fotografias dos lugares de “Vertigo” que seleccionei, e comentá-las. Isto vai exigir uma identificação precisa de cada fotografia e é natural que tenha de vos enviar este texto em duas fases, para permitir o número de fotografias necessárias.

Espero que se lembrem razoavelmente bem do enredo do filme, porque não lhes irei contar a história toda… Mas, como “pontapé de saída”, sempre vos recordarei que Scottie Fergunson (James Stewart) era um detective da polícia de San Francisco que, juntamente com outro colega, perseguia um ladrão pelos telhados de um edifício da cidade quando, ao dar um salto entre telhados, escorregou e ficou agarrado a um parapeito. O colega deitou-lhe uma mão para o ajudar mas Scottie sofria de vertigens e descontrolou-se. Acabou por sair ileso da situação, mas pior sorte teve o colega que se despenhou no vazio…

Estava Scottie a preparar-se para entrar em pré-reforma quando um antigo colega da Universidade, Gavin Elster, foi ter com ele e lhe pediu ajuda num trabalho. A sua mulher, Madeleine (Kim Novak) estava com comportamentos estranhos e ele queria que Scottie a seguisse. Scottie começou por recusar, mas Gavin assegurou-lhe que não se tratava de nenhum problema passional… Era coisa mais grave que lhe fazia temer pela própria vida da mulher. Combinaram, então, que se encontrariam num restaurante para que Scottie visse a mulher, e depois logo decidiria se aceitaria o trabalho, ou não, … E é claro que Scottie, depois de ver a Madeleine/Kim Novak, aceitou…!

Vamos então às cenas.

Colaboração de Luís Mira

6 comentários:

filhote disse...

Luís Mira:

Se me lembro do enredo de "Vertigo"?... hum... vejo esse filme umas duas vezes por ano desde há décadas... e oiço a banda sonora pelo menos uma vez por mês!

"Pancada"? Sem dúvida. Mais uma pancada que temos em comum, meu caro. Para além de "doente" de Alfred Hitchcock, confesso, "Vertigo" é um dos filmes da minha vida - já o tinha escrito por aqui. E também por vários argumentos objectivos e subjectivos.

Estou emocionado, e arrepiado, por esta experiência de, virtualmente, revisitar os locais de "Vertigo".

E, é claro, não resisti a acompanhar a experiência com a extraordinária banda sonora de Bernard Herrmann. "Madeleine and Carlotta's Portrait", neste momento...

Obrigado por mais esta instigante prosa.

(S)LB disse...

Hum...

Com licença do autor destes magníficos posts (Luís Mira), que não tenho o prazer de conhecer pessoalmente, recordo-me de já aqui ter lançado o 'réptil' há algum tempo (meses? anos?), no início da sua colaboração neste estaminé, mas renovo o desafio:
-estes seus belíssimos relatos, ou crónicas de viagem, não merecerão, pelo menos, um blog autónomo, quiçá mesmo uma edição impressa publicada por um editor que ande (algo) desatento?

Eu, (caso não coincidisse com a minha quase constante ausência de Portugal), concerteza que seria um dos primeiros da fila a pedir o seu autógrafo e dedicatória no meu exemplar, aquando do evento de lançamento do livro!

Spread the message!

Luis Mira disse...

Gente simpática, esta...

Eu sempre disse que os meus "Amigos Benfiquistas", independentemente do momento trágico em que enveredaram por esse mau caminho, têm um fundo intrinsecamente bom...!

Agora a sério:

É verdade, Filhote, que a música de Bernard Herrmann, tal como a de Nino Rota, por exemplo, tem a capacidade de nos fazer "ver o filme" sem sequer necessitarmos de imagens...

Mais uma vez lhe agradeço, (S)LB,
o comentário e a sugestão. Mas tempo é coisa que me falta... Agora que começo, lentamente, a tomar o gosto à "blogosfera", talvez daqui a alguns (poucos, espero...) anos possa ter algum tempo para me dedicar a um ou dois temas, relacionados com a Música e o Cinema, onde penso que a minha documentação pessoal e os meus comentários podem ter "valor acrescentado" para outras pessoas.

Quanto à publicação em livro, se alguma vez ela se verificar, dúvido que se formem grandes filas para autógrafos... Mas aí seria "my pleasure" oferecer-lhe a "obra", em agradecimento e reconhecimento pelo seu incentivo...

Entretanto, se puder ser apanhado em Lisboa nesses dias, veja se aparece nos almoços do blogue organizados pelo Luis, para que lhe possamos dar um abraço pessoalmente. Não se iniba... Eu sei que o nome não augura nada de bom mas, que diabo, a pigmentação avermelhada nesses almoços já é tanta, que mais um não afecta nada...!

Um abraço a ambos!

NB:

É da mais elementar justiça que se agradeça também ao LPA e a Gim-Tonic...

O primeiro pelo "tempo de antena".

O segundo pela enorme trabalheira que teve com a montagem destes textos. Eu desaconselhei-o vivamente a fazê-lo, não porque tenha qualquer coisa contra mas porque me pareceu uma violência espetar com 17 fotografias num blogue, relacionadas com um tema que, muito provavelmente, não interessa nada à esmagadora maioria dos viajentes. Mas ele discutiu o assunto com o "Patrão", e decidiram assim...

(S)LB disse...

Pois saiba, amigo Mira, que a pigmentação vermelha nesses almoços é directamente proporcional a qualquer pigmentação estatística do Minho aos Algarves, exceptuando 2 pequenos redutos (um, em vias de extinção - oxalá não! - ou como agora se diz, belenesização e o outro reduto mais a norte, repleto de nobre e honesta gente com carácter, mas dirigido por alguém desprovido dele!).

Saiba tb que o pseudónimo sob o qual assino estas linhas é resultado (cujos 'pais' são Mr. LT e filhote) de uma feliz coincidência do meu nome, com a sigla da instituição que me corre nas veias em Portugal, porque, bem vistas as coisas, sou coerente: no Brasil e no Rio, sou Flamengo e em S.Paulo, torço um pouco pelo Corinthians!

Mas, voltando ao tema, todo o espólio de crónicas suas produzido neste mesmo blogue já daria algum material digno de uma edição ao prelo!

Eu sei e não é difícil apercebermo-nos, que para além das viagens, as suas paixões são o cinema e a música. Feliz conjugação de interesses!

Talvez um destes dias eu perca o (pouco) pingo de vergonha que me resta na cara e caia na tentação de lhe pedir uma espécie de favor pessoal, uma encomenda de crónicas de um tema que é uma velha paixão minha, que tem por items: New York, Sergio Leone, 'Once Upon a Time in America' e Ennio Morricone...


Mas como me falta a coragem...

Luis MIra disse...

Mistura explosiva, Caro S(LB)!

Quem sabe se um dia não vem a propósito, porque uma das coisas que me daria muito gozo era pegar nesse filme por um lado que me parece ter sido muito pouco explorado: a maneira como Leone homenageia nesse filme os fotógrafos clássicos americanos.

Mas se para escrever é necessário "paixão", se vocé tem essa paixão pelo tema, se escreve bem como deixa perceber, porque razão não deita vocé mesmo cá para fora o que sente, em vez de encomendar "enlatado" a terceiros...?

Um abraço!

(S)LB disse...

Não me atreveria , nem ousaria a tal, caro xará!

Estou cônscio das minhas limitações e sei os meus limites, apesar de reconhecer que a paixão move montanhas!

Eu sou mais ou menos uma espécie de Médici sem cheta, um mecenas pelintra, que se limita a incentivar os génios!