segunda-feira, 18 de agosto de 2008

HOMENAGEM A JOSÉ GAMITO


Tinha prometido prestar aqui a minha homenagem a José Gamito. Só o faço agora, porque também só agora encontrei a entrevista que lhe fiz em 1997, mais propriamente no dia 22 de Março de 1997.

Ei-la:

José Gamito, advogado, 46 anos, compra discos de vinil desde os 13 anos. A sua primeira aquisição, em 1963, foi "Mocidade Em Férias", dos Shadows, na discoteca Melodia, na rua do Carmo em Lisboa. Custou-lhe 63$30.

Até hoje, não mais deixou de comprar discos de vinil. CD, só os "piratas" dos Beatles. Não sabe quantos discos tem, porque nunca os recenseou. Apenas sabe que tem discos que não vende e outros que vende.

Os que não vende fazem parte da sua colecção particular. "Quando comprei o primeiro disco, não fazia ideia que ia fazer uma colecção, mas já tinha a noção de que iria comprar todos os discos do artista x ou do grupo y", afirma.

A sua colecção particular centra-se fundamentalmente no pop/rock dos anos 50, 60 e 70. Da música que se faz hoje em dia, não liga, nem gosta, com excepção, talvez, dos Oasis, Beautiful South e Joan Osborne.

"A partir do rap, a música que se faz fez-me secar o gosto por ela", justifica, enfatizando que continua "fiel" ao vinil.

Relativamente à sua colecção particular, revela que o seu maior tesouro talvez seja um EP, de edição portuguesa, dos Episode Six, uma banda britânica que precedeu os Deep Purple. "É um disco que está cotado no estrangeiro", diz.

O EP, editado em 1967, em Portugal, pela Arnaldo & Trindade, tem o número de catálogo PYE PAT 54004 e inclui "Morning Dew", "Sunshine Girl", "Love, Hate, Revenge" e "Baby, Baby, Baby".

"Mas tenho outras preciosidades. Dos anos 50, por exemplo, tenho EPs e LPs originais de Elvis Presley, Buddy Holly, Eddie Cochran, Gene Vincent, Fats Domino", disse, não sabendo porém o seu valor de mercado.

"Não sei, nem quero saber, porque nunca os venderia", precisou.

Quanto aos anos 60, onde se sente mais à vontade, José Gamito considera que um EP de Zeca do Rock, com canções do filme
"Pão, Amor E Totobola", é o seu disco mais valioso.

"É muito complicado saber-se o valor de mercado, porque em Portugal não há este mercado de coleccionador. Eu sou o único no terreno. Tudo se rege pela lei da oferta e da procura. Não há qualquer cotação. Se tivesse dois exemplares do disco do Zeca do Rock vendê-lo-ia por 15 mil escudos. Não tendo, não vendo por preço algum", afirmou.

Além de Zeca do Rock, José Gamito considera também que discos do Conjunto Mistério, Ekos, Titãs, Jets, Claves, Gentlemen, Espaciais, Demónios Negros e Conchas são igualmente valiosos.

"Fora os conjuntos musicais, Amália Rodrigues e José Afonso são os mais procurados", adiantou.

Relativamente à música não nacional dos anos 60, José Gamito não hesita em considerar que os discos dos Beatles, Rolling Stones, Kinks, Beach Boys, Byrds e Lovin' Spoonful são os mais desejados.

Nesta área, o disco mais raro que possui é um LP de 10 polegadas, da Polydor francesa, com as primeiras gravações dos Beatles, como "My Bonnie" e "Ain't She Sweet". "É um disco que vale mais de 100 contos".

"Sei que as edições da Parlophone, a amarelo, de "Sgt. Pepper's", "The Beatles", "Abbey Road" e "Let It Be", todas dos Beatles, valem mais de 200 contos cada uma lá fora, mas o álbum da Polydor francesa é, para mim, o mais valioso", disse.

José Gamito cita também entre as suas raridades o álbum original dos Rolling Stones, "Beggar's Banquet", os três EPs portugueses dos Kinks e o primeiro dos Status Quo.

"O disco que mais gostava de ter - e que não tenho - é o único da colecção de Van Morrison que me falta, "Blowin' Your Mind", de 1968. É claro que o que eu mais queria ter era o da "butcher cover", dos Beatles, mas como isso é impossível, contentava-me com o primeiro de Van Morrison, de quem também sou grande fã", disse.

Quanto aos anos 70, José Gamito não esquece as primeiras edições de Elton John, David Bowie e Lou Reed e, nos portugueses, Filarmónica Fraude, cujas bobinas originais das gravações parecem terem desaparecido da Polygram.

O excedente da colecção particular de José Gamito alimenta a única loja em Lisboa de discos de vinil, usados, para coleccionadores ou interessados. Chama-se Discolecção e situa-se na galerias do Hotel Amazónia, ao pé do Jardim das Amoreiras.

"Vêm cá sobretudo três tipos de pessoas: os verdadeiros coleccionadores, os que só são coleccionadores de vinil e os que só são coleccionadores de um determinado grupo ou artista", explicou.

"Há também os que vêm à procura do disco que lhes lembra uma boa namorada, um bom filme ou umas boas férias", acrescentou.

Amália Rodrigues, José Afonso, cantores portugueses de intervenção, Beatles, Doors, Kinks, Rolling Stones e, mais recentemente, rock alemão, continuam a ser as perguntas de quem entra na loja.

"Não vivo à custa da loja, a loja é que vive à minha custa", disse, recusando a ideia de que seja um "negócio". "Tudo é feito e transaccionado com o espírito de coleccionador", afirmou. "A música não vale pelo seu preço".

O disco mais raro que tem à venda na sua loja é a edição alemã de "Odessa", dos Bee Gees, e também o EP dos portugueses Jotta Herre com "Penina", de Paul McCartney.

Além de lidar com a música, José Gamito também a pratica. Enquanto adolescente, nos anos 60, fez parte dos Complications, grupo que "bateu" todos os Liceus de Lisboa e arredores.

Hoje em dia, José Gamito ainda toca guitarra com José Ribeiro Queiroz (baixo) e Vasco Ribeiro Sanches (bateria), ensaiando de quando em quando na Ericeira música dos anos 60 como "I'll Feel A Whole Lot Better", dos Byrds, "Birthday", dos Beatles, "Jumpin' Jack Flash", dos Rolling Stones, ou "It's All Over Now Baby Blue", de Bob Dylan.

"Ele é o nosso Henrique Mendes. É ele que nos proporciona e organiza o nosso ponto de encontro", diz Vasco Ribeiro Sanches.

LPA

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